(Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência) (1)
Nota prévia:
Talvez o anteprojecto ande a passar despercebido por se pensar que se trata apenas da necessária adaptação dos cursos de formação para a docência, no contexto do Processo de Bolonha, aos dois ciclos agora designados, respectivamente, por licenciatura e mestrado. Essa adaptação não está em causa, mas já o está preocupantemente (não só a meu ver, mas também na visão de personalidades autorizadas do ensino superior, quer universitário, quer politécnico) pela fuga da actual equipa do ME à oportunidade de uma correcção (que há muito se impõe) a perspectivas de formação generalista de professores do ensino básico destinados à leccionação do 2º Ciclo, e agravadas pelo alargamento dessa perspectiva à formação dos professores do 3º Ciclo.
"O anteprojecto de decreto-lei do Ministério da Educação sobre o regime jurídico da habilitação profissional para a docência (...) parte de um princípio muito discutível na definição do perfil do professor desses dois grandes ciclos de formação (básico e secundário): o professor generalista. " (Carlos Ceia, 8 - 11-2006)(2)
Nota prévia:
Talvez o anteprojecto ande a passar despercebido por se pensar que se trata apenas da necessária adaptação dos cursos de formação para a docência, no contexto do Processo de Bolonha, aos dois ciclos agora designados, respectivamente, por licenciatura e mestrado. Essa adaptação não está em causa, mas já o está preocupantemente (não só a meu ver, mas também na visão de personalidades autorizadas do ensino superior, quer universitário, quer politécnico) pela fuga da actual equipa do ME à oportunidade de uma correcção (que há muito se impõe) a perspectivas de formação generalista de professores do ensino básico destinados à leccionação do 2º Ciclo, e agravadas pelo alargamento dessa perspectiva à formação dos professores do 3º Ciclo.
"O anteprojecto de decreto-lei do Ministério da Educação sobre o regime jurídico da habilitação profissional para a docência (...) parte de um princípio muito discutível na definição do perfil do professor desses dois grandes ciclos de formação (básico e secundário): o professor generalista. " (Carlos Ceia, 8 - 11-2006)(2)
Note-se ainda a perspectiva expressa na Lei 115/97, que alterou, entre outros, o artigo 31º Da Lei de Bases do Sistema Educativo em vigor desde 1986: "A formação dos educadores de infância e dos professores dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico realiza-se em escolas superiores de educação e em estabelecimentos de ensino universitário." (Artº 31º, ponto 3) - alterando o disposto na alínea c do ponto 1 do correspondente artigo de 86, que estipulava: "A formação de professores do 3.º ciclo do ensino básico e de professores do ensino secundário realiza-se em universidades.(destaques meus)
(Fim de nota prévia)
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Deixo de lado pareceres de professores do ensino universitário, tais como o de João Pedro Ponte em 2004 (3), emitido a pedido da então Ministra da Ciência e do Ensino Superior(4), no qual (considerando que "nos primeiros níveis do sistema educativo evidencia-se o papel do professor generalista, que tem a responsabilidade por uma turma, enquanto que nos níveis mais avançados, o papel do professor está claramente vinculado a uma disciplina ou área disciplinar" e que "a transição entre os dois tipos de perfil profissional faz-se sobretudo no 2ºciclo do EB") é salientado que se justifica "uma atenção especial à formação dos professores do 2º ciclo do EB".
Destaco em especial, sim, o parecer(5) do grupo de trabalho nomeado pelo CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos) para dar resposta à solicitação de elaborar “o perfil de competências e de conhecimentos referentes à profissão de educador/professor”. Destaco-o por ser um parecer de uma comissão constituída por professores das próprias ESEs (seis ESEs), quase todos coordenadores das mesmas, ficando eu perplexa perante o ignorar (ou despresar) também desse parecer por quem elaborou o Anteprojecto referido no título deste post.
Reportando-me apenas à questão que relevo neste escrito - a formação dos professores do 2º Ciclo -, deixo para comparação pelos meus eventuais leitores as respectivas propostas que se seguem.
Do Grupo de trabalho nomeado pelo CCISP:
Ramos propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos -
· Educador de infância
· Professor do 1º ciclo do ensino básico
· Professor do 2º ciclo do ensino básico em ______ (áreas definidas no quadro das habilitações para a docência)
Do Anteprojecto da actual equipa do ME:
Domínios de habilitação para a docência propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos (totalidade das alternativas propostas) -
. Educador de Infância
. Professor do Ensino Básico: 1º Ciclo
. Educador de Infância e Professor do Ensino Básico: 1.º ciclo
. Professor do 1.º e do 2.º Ciclo do Ensino Básico
(Destaques meus)
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Links para as referências:
(1) Ante projecto de Decreto-Lei - Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência (Ver anexo, p. 21)
(2) Parecer - p. 1 - 1.
(3) Parecer - p. 14
(4) Diário da República, pp. 10 579-80
(5) Parecer do Grupo de Trabalho nomeado pelo CCISP (Ver quadro, p. 4)
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ADENDA
Para além de o anteprojecto não deixar alternativa aos formandos que queiram optar exclusivamente pela leccionação no 2º Ciclo (até por não se sentirem vocacionados para o 1º), o que sobressai essencialmente é a persistência do ME em não reconhecer as insuficiências e deficiências (para as quais tem havido vários alertas) inevitáveis quando, numa formação de duração curta para todas as vertentes que pretende contemplar, se integram simultaneamente uma formação teórica generalista (justificável num tronco inicial comum), uma profissionalização em termos de prática (a substituir os antigos estágios pós formação científica) e uma formação científica e didáctica já necessariamente especializada em disciplinas ou áreas de duas disciplinas, tudo isto juntando a habilitação para a monodocência no 1º Ciclo com a habilitação para a docência no 2º Ciclo.
Não é preciso lembrar que o professor tem que saber bastante mais do que o que ensina a nível básico, sob pena de ter dificuldade em iniciar os alunos em conhecimentos e no processo de elaboração de conceitos em bases correctas e seguras. E, ainda que muitos professores colmatem autonomamente insuficiências de formações iniciais que lhes são proporcionadas, tal não pode ser tomado como princípio, sendo seu direito (e dos alunos) receberem uma formação não prejudicada seja por interesses obscuros, seja por motivos economicistas.
(Fim de nota prévia)
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Deixo de lado pareceres de professores do ensino universitário, tais como o de João Pedro Ponte em 2004 (3), emitido a pedido da então Ministra da Ciência e do Ensino Superior(4), no qual (considerando que "nos primeiros níveis do sistema educativo evidencia-se o papel do professor generalista, que tem a responsabilidade por uma turma, enquanto que nos níveis mais avançados, o papel do professor está claramente vinculado a uma disciplina ou área disciplinar" e que "a transição entre os dois tipos de perfil profissional faz-se sobretudo no 2ºciclo do EB") é salientado que se justifica "uma atenção especial à formação dos professores do 2º ciclo do EB".
Destaco em especial, sim, o parecer(5) do grupo de trabalho nomeado pelo CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos) para dar resposta à solicitação de elaborar “o perfil de competências e de conhecimentos referentes à profissão de educador/professor”. Destaco-o por ser um parecer de uma comissão constituída por professores das próprias ESEs (seis ESEs), quase todos coordenadores das mesmas, ficando eu perplexa perante o ignorar (ou despresar) também desse parecer por quem elaborou o Anteprojecto referido no título deste post.
Reportando-me apenas à questão que relevo neste escrito - a formação dos professores do 2º Ciclo -, deixo para comparação pelos meus eventuais leitores as respectivas propostas que se seguem.
Do Grupo de trabalho nomeado pelo CCISP:
Ramos propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos -
· Educador de infância
· Professor do 1º ciclo do ensino básico
· Professor do 2º ciclo do ensino básico em ______ (áreas definidas no quadro das habilitações para a docência)
Do Anteprojecto da actual equipa do ME:
Domínios de habilitação para a docência propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos (totalidade das alternativas propostas) -
. Educador de Infância
. Professor do Ensino Básico: 1º Ciclo
. Educador de Infância e Professor do Ensino Básico: 1.º ciclo
. Professor do 1.º e do 2.º Ciclo do Ensino Básico
(Destaques meus)
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Links para as referências:
(1) Ante projecto de Decreto-Lei - Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência (Ver anexo, p. 21)
(2) Parecer - p. 1 - 1.
(3) Parecer - p. 14
(4) Diário da República, pp. 10 579-80
(5) Parecer do Grupo de Trabalho nomeado pelo CCISP (Ver quadro, p. 4)
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ADENDA
Para além de o anteprojecto não deixar alternativa aos formandos que queiram optar exclusivamente pela leccionação no 2º Ciclo (até por não se sentirem vocacionados para o 1º), o que sobressai essencialmente é a persistência do ME em não reconhecer as insuficiências e deficiências (para as quais tem havido vários alertas) inevitáveis quando, numa formação de duração curta para todas as vertentes que pretende contemplar, se integram simultaneamente uma formação teórica generalista (justificável num tronco inicial comum), uma profissionalização em termos de prática (a substituir os antigos estágios pós formação científica) e uma formação científica e didáctica já necessariamente especializada em disciplinas ou áreas de duas disciplinas, tudo isto juntando a habilitação para a monodocência no 1º Ciclo com a habilitação para a docência no 2º Ciclo.
Não é preciso lembrar que o professor tem que saber bastante mais do que o que ensina a nível básico, sob pena de ter dificuldade em iniciar os alunos em conhecimentos e no processo de elaboração de conceitos em bases correctas e seguras. E, ainda que muitos professores colmatem autonomamente insuficiências de formações iniciais que lhes são proporcionadas, tal não pode ser tomado como princípio, sendo seu direito (e dos alunos) receberem uma formação não prejudicada seja por interesses obscuros, seja por motivos economicistas.
Mas a pergunta que deixo é a seguinte:
Se, como vimos, são também os responsáveis por várias ESEs que apontam para cursos distintos de formação para leccionação respectivamente do 1º e do 2º ciclos (ainda que, como já disse, possam ter um tronco inicial comum), quem são então os mentores do anteprojecto do ME? Mais: Há "lobbies" pressionando? Há interesses a não tocar? (Sem entrar em suspeições de que não tenho provas, não deixa de ser impossível que não ocorra às nossas mentes o envolvimento e comprometimento, de há muito tempo, com as ESEs e as formações por elas prestadas, de um certo senhor que é actualmente Secretário de Estado da Educação).
__________
P.S. Ler, a propósito, notícia do Público aqui, e também notícia aqui de que o ME enviou o anteprojecto aos sindicatos "apenas para dar conhecimento"
Se, como vimos, são também os responsáveis por várias ESEs que apontam para cursos distintos de formação para leccionação respectivamente do 1º e do 2º ciclos (ainda que, como já disse, possam ter um tronco inicial comum), quem são então os mentores do anteprojecto do ME? Mais: Há "lobbies" pressionando? Há interesses a não tocar? (Sem entrar em suspeições de que não tenho provas, não deixa de ser impossível que não ocorra às nossas mentes o envolvimento e comprometimento, de há muito tempo, com as ESEs e as formações por elas prestadas, de um certo senhor que é actualmente Secretário de Estado da Educação).
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P.S. Ler, a propósito, notícia do Público aqui, e também notícia aqui de que o ME enviou o anteprojecto aos sindicatos "apenas para dar conhecimento"
4 comentários:
Isabel concordo contigo e com as tuas apreensões.
Do que já se conhece sobre as vertentes necessárias e indispensáveis da formação de professores, assim com das lacunas evidentes de certas formações que existem actualmente, não se percebe porquê perseverar nos mesmos erros.
Haverá uma concepção de professor generalista, de formação apressada, pouco aprofundada, difusa. Professor mais barato, fácilmente empregável, manejável e descartável. É esse um possivel sentido que descortino.
Obrigada pela chamada de atenção Isabel. A ver no que vai dar...
Bjinhos.
É a estratégia da aranha...
Nada como um banho de realidade para começar o ano. Obrigada por te manteres atenta e vigilante e nos passares esta informação!
Beijinhos
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