quinta-feira, maio 22, 2008

As nossas crianças estão a ser usadas

Eu já escrevo pouco, mas, neste momento, acho que devo mesmo não escrever nada e pôr o cantinho em pausa. Porque não estou a conseguir manter a serenidade , nem a esperança de que o tempo depressa comprove os profundos erros da actual política educativa.

As crianças portuguesas - as nossas crianças - estão a ser usadas.
Usadas para diminuir o deficit;
usadas para as estatísticas que os governantes pretendem apresentar;
usadas em prejuízo de terem bons e cada vez melhores professores porque estes estão a ser transformados em burocratas e educadores generalistas;
usadas para que o país imite modelos educativos de outros, mas como quem imita receitas de cozinha pondo na panela apenas alguns dos ingredientes (e de má qualidade) porque os outros não são baratos;
usadas como cobaias em experiências apressadas e sem qualquer estudo sério que fundamente as mudanças a partir do que se tenha efectivamente comprovado necessitar de mudar;
usadas também ao sabor de cabeças que se consideram iluminadas e só ouvem opiniões que (e quando) lhes convêm, desprezando arrogantemente muitas e muitas outras de reconhecida idoneidade e competência.

Começo a olhar para esta grande causa que também foi minha (e não consigo abandonar) - a Educação - com uma tristeza que significa desesperança, e a desesperança é um sentimento que toda a vida recusei convictamente. Quero continuar a recusá-la e a apelar a outros que também a recusem, no entanto está a ser-me difícil, pois constantemente se avolumam os motivos de preocupação sobre o rumo do sistema educativo no nosso país. Assim, sendo ainda mais impotente do que os que estão no terreno da escola, dado que já lá não estou, não vale a pena tentar analisar situações ou documentos quando estou - como estou agora - a reagir ao actual rumo da Educação com pouca serenidade e cada vez maior incredulidade.
Onde está a razão, só o tempo mostrará.
Vou tentar esperar calada - calada pelo menos até conseguir escrever sem desesperança.

5 comentários:

Teresa Martinho Marques disse...

Infelizmente é tão verdade o que dizes...
Beijinhos e bom fim-de-semana

Anónimo disse...

Não conhecia o seu blogue. Vim atrás da (do) IC que encontrei num comentário. Desanimar não parece ser o seu estilo.Vou deixar-lhe um poema da Natália Correia que me anima (às vezes). Espero que a anime também.

Creio nos anjos que andam pelo mundo,
creio na deusa com olhos de diamantes,
creio em amores lunares com piano ao fundo,
creio nas lendas, nas fadas, nos atlantes;
creio num engenho que falta mais fecundo
de harmonizar as partes dissonantes,
creio que tudo é eterno num segundo,
creio num céu futuro que houve dantes,

creio nos deuses de um astral mais puro,
na flor humilde que se encosta ao muro,
creio na carne que enfeitiça o além,

creio no incrível, nas coisas assombrosas,
na ocupação do mundo pelas rosas,
creio que o amor tem asas de ouro. Amém.

IC disse...

Obrigada, Ana Paula. O poema é muito bonito e faz bem. De facto não sou pessoa que costume desanimar. Mas, quando já não se está no activo, quando já não se pode contribuir e lutar na prática e se observa o que está a acontecer, é difícil não perguntar com tristeza: Para quê tudo o que se deu? (Tudo o que tantos deram)
Mas este estado de espírito passa :)
"Creio (...) na ocupação do mundo pelas rosas"... Hei-de postar esse poema em breve ;)

Anónimo disse...

Compreendo o seu estado de espírito e a sua revolta interior. Todos os professores que amam a sua profissão estão profundamente desiludidos com os caminhos que estão a ser rasgados para a educação deste país.
Numa luta, seja ela qual for, há sempre momentos de pausa, para retemperar forças e regressar mais forte.

henrique santos disse...

Isabel
o capital de conhecimento que tens é importantíssimo. Por isso mesmo sem estar no "activo" consegues escrever dessa forma tão informada e lúcida sobre os tempos que correm: os teus últimos posts são disso testemunho. Não esperes calada. Este é tempo de falar.