terça-feira, fevereiro 27, 2007

"Circunstâncias" não são irreversíveis nem imutáveis

Estava pensando com os meus botões que a consciência do aprisionamento de políticas nacionais (refiro-me a várias nações) a uma "globalização" infectada por poderoso "vírus" e a frequente centração do meu pensamento nisso (o que pouco se nota aqui porque este é um blog voltado para a educação e o ensino no nosso país) anda a desviar-me da procura de um entendimento sereno de atitudes e comportamentos que se vão propagando entre muitos dos cidadãos comuns, isto é, os cidadãos que não são detentores de poder político ou económico (incluindo professores, que são pessoas e cidadãos como todos os outros) . E o entendimento é necessário - não significa consentimento ou concordância com determinadas atitudes ou comportamentos - para que ideias ou mensagens que procurem fazer contraponto a um tempo empobrecido de valores e de pensamento crítico, no sentido de uma consciencialização (ou de uma educação preparatória dela, se se trata de crianças e adolescentes), sejam emitidas de modo a que não sejam recebidas de pé atrás devido a alguma intolerância destituída de compreensão humana. (Há os objectivos e os comportamentos para os quais sou intolerante, mas não é nesses que estou agora a pensar)
E, nesse meu cogitar, bateu-me na mente que "o homem é ele e suas circunstâncias" e muito difícil se lhe torna reagir às circunstâncias quando elas não são individuais nem especificamente situadas, mas sim instiladas na sociedade pela força que têm as políticas e ideologias dos que dominam - não já, nos dias de hoje, os governos diferentes de cada país, mas os que dominam o mundo.

Em suma, pensando nessa frasse de Ortega y Gasset, penso nas "circunstâncias" com um sentido terrivelmente amplo e avassalador, a parecerem irreversíveis, irremovíveis, imutáveis. Será de estranhar que muitos optem por não resistir, até por sentimento de impotência?
Por isso, são indispensáveis não só as vozes que apelem a resistir e não desistir, mas também uma divulgação por todos os meios possíveis do "acordar" e dos movimentos que, pelo mundo, se vão criando e ampliando contestando a inevitabilidade ou irreversibilidade que se pretende incutir nas mentes, movimentos esses que poderiam restituir a esperança, mas cujas notícias se vão mantendo abafadas a fim de se impedirem expectativas encorajadoras. A concentração e controle dos grandes meios de comunicação/informação nas mãos do poder financeiro permite bombardear as mentes e estabelecer a confusão entre "globalização" e "ideologia da globalização" (como alguém dizia, não recordo quem), mas a mundialização da resistência e da luta por uma sociedade efectivamente democrática não é uma utopia.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Adenda (?)

Ao ler este post do Henrique Santos, bem como o artigo que nele também é referido (sugiro vivamente ambas as leituras), deixei um comentário pedindo desculpa ao Henrique pela ocupação do seu espaço dado que, neste meu, continuo a precisar de um considerável intervalo, indo apenas "postando" intermitentemente para não o fechar por um tempo. Mas, depois, fui eu mesma que não aceitei as minhas desculpas, por isso venho acrescentar uma parte do comentário que deixei, de certo modo como adenda ao meu post anterior. Assim, "transcrevo -me", a mim mesma:

Não sei se vou dizer uma barbaridade, mas começo a pensar na necessidade de os professores se descentrarem do ECD para se voltarem para a denúncia do real significado das actuais políticas educativas (relativas ao ensino, aos alunos), voltadas exclusivamente para os interesses económicos e, portanto, para os interesses relativamente ao mercado de trabalho. Não são os professores sozinhos que vão conseguir lutar contra isso, claro, mas as lutas laborais sectoriais actualmente pouco ou nada demovem governos (...).
Penso que só numa ampla consciencialização de povos e em amplos movimentos se virá a conseguir fazer recuar a subserviência ao neo - liberalismo desenfreado, e que só um recuo nisso poderá ter efeitos quer na questão de fundo que é a escola pública e o direito à educação e ao ensino em igualdade de oportunidades, quer também nas próprias questões laborais. Já não acredito que, neste momento, sirva de grande coisa lutar contra cada medida isolada, são as visões e objectivos globais que estão por detrás delas que têm que ser combatidos ( e de nada serve o partido do nosso governo chamar-se socialista, quem está no governo está lá para cumprir os ditames "globais").

sábado, fevereiro 24, 2007

"Animar a malta", "acordar a malta"...

É totalmente compreensível o desânimo que o novo ECD trouxe aos professores. Mas eu não acredito que o tempo (e não muito) não venha a impor a evidência dos seus erros e a sua correcção (desde que os professores não deixem de lutar por isso). Maria de Lurdes Rodrigues destruiu o anterior ECD em poucos meses, o actual também poderá ser alterado - esta ministra mais a sua equipa têm os seus dias contados.
Mas há decretos bem mais difíceis de virem a ser emendados, além de as suas consequências demorarem muito mais tempo a tornar-se evidentes e a acordar, inclusivamente, os pais deste país cujos filhos vão ser cobaias em experiências gravemente insensatas. Estou a pensar especialmente no novo regime jurídico da formação de professores.

Não me apetece escrever, não vou alongar-me, mas este post impôs-se-me ao recordar como era a "carreira" de professor quando nela ingressei, inclusivamente no aspecto remuneratório - isso não foi eterno, e as lutas não foram inúteis! Ao recordar também que mesmo no tempo do "Estado Novo" (no qual ainda vivi já como professora) "
sempre existiu um respeito pelo saber próprio, disciplinar, dos docentes. Poderia existir um esforço de inculcação ideológica, mas não era negado o valor do saber académico e científico, a que se juntava uma formação pedagógica" - uso as palavras do Paulo Guinote não só porque, como disse, não me apetecia escrever, mas também porque o Paulo tem feito um extenso trabalho de análise e desmontagem cuja leitura recomendo a quem eventualmente não esteja a acompanhá-lo.

A degradação do ensino público no nosso país não começou, como todos sabemos, com Maria de Lurdes Rodrigues e, se a qualidade desse ensino não desceu ainda mais, tal deve-se aos professores, à sua dedicação, ao seu empenhamento (àqueles que não se podem honrar disso, avalie-se, forme-se, e excluam-se até da profissão os que eventualmente se fechem a qualquer avaliação formativa).
Penso, pois, que é preciso "animar a malta". Mas penso também que é preciso que esse ânimo se volte para o "acordar a malta" - "malta" aqui muito mais ampla, estendendo-se à tomada de consciência de uma opinião pública que a actual equipa do Ministério da Educação tacticamente começou por manipular a ponto de a senhora Maria de Lurdes Rodrigues poder atrever-se a essa frase insana "Perdi os professores mas ganhei a população".

E mais não escrevo - deixo o "animar" e o "acordar" para os mais novos (e também para os que ainda estão nas escolas por serem menos 'velhos') do que eu.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Deixou-nos há 20 anos...

No dia 23 de Fevereiro de 1987 dissemos adeus a José Afonso, dissemos:
Até sempre, Zeca!



Que amor não me engana
Com a sua brandura
Se de antiga chama
Mal vive a amargura

Duma mancha negra
Duma pedra fria
Que amor não se entrega
Na noite vazia

E as vozes embarcam
Num silêncio aflito
Quanto mais se apartam
Mais se ouve o seu grito

Muito à flor das águas
Noite marinheira
Vem devagarinho
Para a minha beira

Em novas coutadas
Junto de uma hera
Nascem flores vermelhas
Pela Primavera

Assim tu souberas
Irmã cotovia
Dizer-me se esperas
O nascer do dia

José Afonso


quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Coisas de avó e neto

Tenho que deixar registada no meu cantinho a 4ª feira das férias de Carnaval do meu neto - então não é que pela primeira vez ele conseguiu ganhar-me no bowling?! Até seria natural, aos 13 anos já se pode jogar bem mesmo com pouco treino, mas o caso é que ele de vez em quando ainda se precipita e lá cai a bola antes de chegar a um terço do percurso, enquanto eu tenho cá na ideia que as minhas bolas quando caem é mesmo só quase quase lá no fim... (hummm... será mesmo?)

Desconfio que não estou só a registar a vitória do neto, estou é também a dar-me oportunidade para um próximo registo da desforra! [Pois claro, eu faço muita questão de me manter em forma por mais todo o tempinho possível, por várias razões, e mais uma que é a de prolongar o prazer de serem os netos a convidar-me para desafios - de bowling e outros! ;)]


(Pois... podia ser um clip de vídeo, mas não me apetece pôr vídeos no meu cantinho, pode ser que qualquer dia vá bater à porta do You Tube ou de outro seu concorrente, mas por enquanto não estou nada virada para aí)

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

...

Como sei que a expressão 'férias' de carnaval só é apropriada para os alunos (de mim pensarão muitos que agora estou sempre em férias), não digo que este cantinho vai fazer umas feriazinhas, prefiro dizer que vai fazer um intervalo (como, aliás, vem sendo frequente).
Mas deixo um quadro pendurado na parede e, na mesinha por baixo, mais um
desses poemas em que Bashô exprimia um momento, uma percepção, um estado interior, com a fascinante criação de beleza conseguida em apenas três versos.

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F. Vallotton (1893). La Manifestation.

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P.S. - Destaque para um artigo

Já tinha publicado este post (a iniciar o meu "intervalo") quando li o artigo para que o Henrique Santos chama a atenção aqui. Não resisti a vir reforçar a sugestão do Henrique, para a eventualidade de algum visitante a este cantinho não ter ainda visto essa sugestão de leitura, pois consideraria bem oportuno se o artigo fosse divulgado tanto quanto possível. E não resisti porque o referido artigo não é escrito por um português, o autor não estaria a pensar especificamente na actual política educativa no nosso país, mas (a meu ver) até poderia perfeitamente estar a pensar nela também.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

O que eu esperaria agora se fosse ingénua

Esclarecimento prévio:
Este post não tem a ver com o referendo de ontem, em si, e é independente do resultado pois já estava em draft aguardando apenas pelo dia seguinte. Também (e isto sublinho) não toca os que, contrariamente ao meu voto, optaram pelo não de acordo com a sua reflexão autónoma e séria, baseada em convicções ou na interpretação que pessoalmente fizeram do seu significado - não me pronunciei em lado nenhum público e respeito todas as opções honestas de todas as pessoas que procuram pensar honestamente consigo próprias. Dado este esclarecimento, passo ao que motiva o título do post.
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Vi pouco a TV, mas o suficiente para me aperceber da grande mobilização conseguida por promotores de campanhas ou movimentos. Sei que a mobilização foi de ambos os "lados", mas foi do lado do não que se viram os cartazes "Pelo direito à vida" - o que não estou a criticar, já esclareci que respeito as convicções, além de que não viria agora falar de interpretações da pergunta referendada.

O que eu esperaria agora (se fosse ingénua) é que essa tão grande mobilização conseguida, levando a grandes manifestações "pelo direito à vida", fosse aproveitada para continuarem manifestações por esse direito nas situações verdadeiramente inequívocas. E gostaria também que a política até agora levada a cabo por quem governa me permitisse confiar que medidas sociais, medidas no domínio da assistência na saúde e também medidas que levem a todos, incluindo adolescentes, informação e apoio atempado sobre como evitar gravidez indesejada caminharão no sentido da prevenção, pois julgo que não há mulher nenhuma que tenha praticado aborto (ou que venha a praticá-lo) que não preferisse não ter tido (ou não ter) que enfrentar tal decisão - mas confiar depois de se andar a observar as prioridades do actual governo, concorde-se que não é simples.

O que eu esperaria, se fosse ingénua, era que a TV não perdesse o balanço, lembrando-se agora dos milhões de crianças que nasceram mas eu não sei se se pode chamar vida às suas vidas, morrendo milhares por dia de fome, vivendo muitos e muitos mais milhares sob o terror quotidiano no meio das guerras, inclusive aquelas (a maioria) que são desencadeadas directa ou indirectamente pelos grandes senhores do mundo sob argumentos hipócritas e interesses escondidos, enquanto outros que não são senhores do mundo mas governam em seus países fecham os olhos, subservientes às políticas "globais".
Mas esses milhões de crianças a cujas vidas é difícil chamar vida estão lá longe, noutros sítios do mundo. Pois... Certas bocas só se enchem publicamente em nome da "globalização" quando lhes convém. Denúncias e imagens na TV , por exemplo, não convêm aos que a controlam, incomodam e o que é preciso é acomodar-se - não incomodar-se. E que as pessoas comuns se distraiam, não vão elas lembrar-se, aqui e por outros países, de começarem a incomodar-se demasiado e acabarem por encher as ruas. (Países afastados e protegidos dos dramas da outra metade do mundo pois neles vidas que também não são vida são em proporção ínfima face a esses dramas - são agora, quiçá até um dia...)

(Eu disse no meu post anterior que explicaria a "estranha" associação de ideias que me levara à colocação de uma foto. Eu acredito na sinceridade de muitos que ergueram cartazes "Pelo direito à vida", como na de muitos que ergueram outros contra uma lei punitiva, agora cá, noutros países noutras alturas, mas estou farta dos hipócritas de cá e de lá (e obviamente que agora já não estou a referir-me ao referendo), esses até não precisam de descer à rua para defenderem o que querem defender, esses ou têm na mão os cordelinhos poderosos das políticas, ou penduram-se neles pois isso de não se deixarem ir a reboque exigiria coragem demais...)

sábado, fevereiro 10, 2007

Cá estou eu com as minhas estranhas associações de pensamentos...

Esta foto, logo hoje que é sábado? - sábado e domingo são repouso de fim de semana... Além disso, até vão deixar de morrer de fome em cada dia cerca de 11 mil crianças neste mundo - ou é mentira que ele está a caminho da prosperidade agora que vai ser tudo global?
Mas eu não tenho culpa que o meu pensamento faça sozinho umas associações de ideias, e eu hoje não consigo detê-lo se não lhe fizer a vontade deixando aqui escondidinha no meu cantinho essa foto... (só uma entre tantas acessíveis)
(O meu pensamento não me é assim tão insondável, acho que depois do fim de semana já poderei explicá-lo)

(Foto recolhida há um tempo na net, peço desculpa por não ter guardado o endereço)

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

A grande ironia das minhas leituras

Encomendara um livro (que só comecei a ler ontem) quando ainda pensava adiar por dois ou três anos o pedido de aposentação a que já tinha direito. Trata-se de uma obra de autores de incontestada autoridade no domínio da investigação científica aplicável ao ensino-aprendizagem. (Citarei a obra mais abaixo*)
Tendo ficado ainda na Introdução, na noite passada, deparei-me hoje com um texto referenciado pelo
Henrique Santos neste seu post, e também pelo Paulo Guinote, que o transcreve no seu post aqui.
Infelizmente, esse texto não descreve uma fantasia, mas um futuro possível (e possivelmente muito próximo, pois as "evoluções" agora dão-se a velocidade vertiginosa). Por isso, ao pensar na leitura que ontem iniciei - eu, que já nem preciso de me inteirar de recentes investigações para nortear prática profissional (aliás, a 1ª edição do livro já é de 1999) -, não senti vontade de rir, também não propriamente de chorar, mas sim uma enorme ironia, como que parecendo rídicula a investigação realmente científica no terreno do ensino-aprendizagem face aos interesses, objectivos, perspectivas que imperam no mundo actual, nesta chamada sociedade do conhecimento - designação também a parecer irónica a quem vê o mundo como de e para todos e não de e para alguns apenas.

A quem eventualmente me leia e prossiga até final, peço que, se ainda o não fez, comece por ir ler o texto para o qual pus link acima, a fim de entender a que propósito aparece este meu post.
Da Introdução à obra que comecei a ler (e vou continuar) copio apenas alguns excertos - que limitam a apresentação e alcance da mesma, mas que reduzo até por serem em inglês - somente para dar uma ideia da ironia de que falei. (Ironia, mas não fatal, a meu ver, pois não desisto de uma coisa que se chama Esperança)
___
«From Speculation to Science
(...)
The revolution in the study of the mind that has occurred in the last three or four decades has important implications for education.
(...)
• Research from cognitive psychology has increased understanding of the nature of competent performance and the principIes of knowledge orga­nization that underlie people's abilities to solve problems in a wide variety of areas, including mathematics, science, literature, social studies, and his­tory.
(...)
• Research on learning and transfer has uncovered important principles for structuring learning experiences that enable people to use what they have learned in new settings.
(...)
• Emerging technologies are leading to the development of many new opportunities to guide and enhance learning that were unimagined even a few years ago .
(...)
FOCUS: PEOPLE, SCHOOLS, AND THE POTENTIAL TO LEARN
(...)
• First, we focus primarily on research on human learning (...)
• Second, we focus especially on learning research that has implica­tions for the design of formal instructional environrnents (...)
• Third, and related to the second point, we focus on research that helps explore the possibility of helping all individuals achieve their fullest potential.
(...)
Learning research suggests that there are new ways to introduce stu­dents to traditional subjects, such as mathematics, science, history and ljtera­ture, and that these new approaches make it possible for the majority of individuals to develop a deep understanding of important subject matter. (destaques meus)
(...)
»
* [Bransford, John D., Brown, Ann L. & Cocking, Rodney R. (Ed.) (2000). How People Learn: Brain, Mind, Experience, and School. Washington: National Academy Press].

sábado, fevereiro 03, 2007

Bom fim de semana!

[O meu vai ser um bocadinho prolongado ;)]



Para minha fadiga
um albergue... Mas, oh,
estas glicínias!

Matsuo Bashô
(Trad. Olga Savary)