É estranho isto de já não estar numa escola. Não é que uma só escola dê uma visão representativa do geral, mas sempre fornece algum indicador.
Sobre a actual política educativa no nosso país, continuo a poder saber tudo, e sobre a acção dos acólitos que diligentemente se esforçam por manter o apoio da opinião pública a essa política (penso que já com menos facilidade), também é fácil continuar actualizada. Mas já não ouço, não observo, não sinto o lá de dentro mesmo da escola. E suponho que permanece em vigor a proibição de professores responderem a jornalistas, se interrogados na qualidade de professores de uma escola A ou de uma escola B.
É verdade que no próximo dia 5 muitos professores 'falarão' na rua, mas vão falar essencialmente do projecto de ECD - e com toda a legitimidade -, mas o que a generalidade dos professores pensa desse projecto já eu sei, e queria saber também outras "coisas". Queria saber indícios dos efeitos das medidas da actual ministra da educação, provavelmente até já perceberia alguns se tivesse estado presente numa qualquer amostrinha dos conselhos de turma deste mês. Sua excelência não mandou que estes se organizassem logo em Julho para elaborar projectos de turma? Ou estarei equivocada, pois as turmas são constituídas por alunos, cada uma por estes e não por aqueles, e isso de projectos adequados a cada uma quando vários professores nem a cara dos alunos viram pareceu-me esquisito... Se calhar, Maria de Lurdes Rodrigues não os distingue, não são eles afinal números estatísticos?
E assim, neste não estar no terreno e, ainda por cima, com as escolas a serem silenciadas, não me está a ser fácil o silêncio que, do dentro delas, me chega, bem como a falta de sentir, de "apalpar". Contudo, eu deixei de estar na escola há apenas dois meses e, mesmo que fossem bastantes mais, não deixo, por isso, de conhecer bem e directamente o sistema educativo português desde os tempos da reforma Veiga Simão, conheço os efeitos das sucessivas políticas educativas, das reformas e das várias e diferentes medidas - efeitos na escola pública e no sucesso-insucesso dos seus alunos. Conheço directamente o crescimento das dificuldades e problemas resultantes da massificação do ensino no contexto das realidades sociais do nosso país e, acerca destas, as prioridades e não prioridades políticas, ou as vontades políticas e as faltas de vontade política. Conheço também directamente as sucessivas questões laborais e os comportamentos da classe docente face a elas, bem como as constituições dos sindicatos, evoluções e respectivas acções , tanto mais que não só sou a sócia número 198 do SPGL, como fui delegada sindical durante cerca de 20 anos consecutivos e me mantive, depois disso, muito atenta. E conheci ainda diferentes gerações de professores - não que cada geração seja uniforme, mas não deixa de ter alguma tipicidade -, e, nessas diferentes gerações, não deixaram de ter reflexos os respectivos modelos de formação-profissionalização.
Conheço essencialmente o ensino básico, tenho uma menor percepção do ensino secundário, mas ninguém negará esta afirmação: Não sendo suficiente para garantir a formação dos jovens portugueses, a sua preparação para a vida e o mundo do trabalho (especialmente nesta época em que devem ser preparados para uma contínua formação profissional, para uma constante actualização), não sendo suficiente, dizia, um sistema de ensino básico ou de escolaridade obrigatória de qualidade e exigência e que dê resposta adequada quer à época actual, quer às realidades sociais, tal é, indubitavelmente, condição necessária sem a qual ficará "aleijada" a restante escolaridade, ou a formação profissional subsequente.
Ora, se eu até já sinto falta de continuar no "terreno" para intuir efeitos das medidas da actual ministra da educação, como podem os cidadãos que não são nem nunca foram professores pronunciarem-se tão facilmente como o fazem sobre estas e aquelas medidas e distinguirem as válidas e adequadas das meramente hipócritas? E a pergunta maior é como podem os acólitos, fazedores da opinião pública ou influentes nesta, dormir de consciência tranquila depois de diligentemente propagarem as suas "análises" sem nada conhecerem directamente do referido "terreno"?
É verdade que, no estado em que está o país, serão necessárias algumas medidas ditas economicistas, mas o cidadão comum não aderirá de boa vontade a sacrifícios enquanto vê os escandalosos exemplos de tantos dos que mais podem. Como também os professores não aderirão, pelo menos com a mesma motivação, o mesmo entusiasmo e até com a paixão pelo ensino que caracteriza tantos, nem a medidas sobre as quais nem são ouvidos, impostas com recurso a uma "táctica" já reconhecida noutros países como erro colossal e que é a de denegrir a sua imagem, nem a justificações, em nome da educação-ensino para todos, que percebam eivadas de enorme hipocrisia.
E, já que referi reflexos dos modelos de formação de professores nas respectivas gerações, considero, por exemplo, também insólito o projecto de um exame para ingresso na carreira docente do ensino não superior quando prioridades economicistas já antigas alteraram uma formação inicial exigente quer na vertente científica, quer na vertente da profissionalização, juntando ambas no mesmo tempo de duração que tinha a primeira e retirando, para um ensino tão fundamental ao subsequente como é o do 2º Ciclo, a formação através da prática em estágios em que o professor se formava leccionando, sob orientação, turmas que para o efeito lhe eram atribuídas (para não falar das alterações propostas pela actual ministra aos estágios para 3º Ciclo e Secundário). Das duas, uma: Ou é de qualidade credível a formação ministrada pelas instituições formadoras, ou, se não é (ou nos casos em que não é) os governos não podem alhear-se disso por conveniências economicistas ou por compadrios e não podem deitar-se as responsabilidades exclusivamente para cima dos professores sem se exigir a responsabilização por parte das referidas instituições.
Não podem, em suma, ser compatíveis intenções de melhorar e adequar o sistema de educação e ensino com utilização do ensino público para amealhar tanto dinheiro quanto se consiga.
Que sabe a opinião pública em geral de tudo o que fui referindo em termos de reflexos na escola, na educação, no ensino? Que sabem disso tudo boa parte dos militantemente comentadores quer sobre a "bondade" desta ministra, quer sobre a "maldade" dos professores?
Sobre a actual política educativa no nosso país, continuo a poder saber tudo, e sobre a acção dos acólitos que diligentemente se esforçam por manter o apoio da opinião pública a essa política (penso que já com menos facilidade), também é fácil continuar actualizada. Mas já não ouço, não observo, não sinto o lá de dentro mesmo da escola. E suponho que permanece em vigor a proibição de professores responderem a jornalistas, se interrogados na qualidade de professores de uma escola A ou de uma escola B.
É verdade que no próximo dia 5 muitos professores 'falarão' na rua, mas vão falar essencialmente do projecto de ECD - e com toda a legitimidade -, mas o que a generalidade dos professores pensa desse projecto já eu sei, e queria saber também outras "coisas". Queria saber indícios dos efeitos das medidas da actual ministra da educação, provavelmente até já perceberia alguns se tivesse estado presente numa qualquer amostrinha dos conselhos de turma deste mês. Sua excelência não mandou que estes se organizassem logo em Julho para elaborar projectos de turma? Ou estarei equivocada, pois as turmas são constituídas por alunos, cada uma por estes e não por aqueles, e isso de projectos adequados a cada uma quando vários professores nem a cara dos alunos viram pareceu-me esquisito... Se calhar, Maria de Lurdes Rodrigues não os distingue, não são eles afinal números estatísticos?
E assim, neste não estar no terreno e, ainda por cima, com as escolas a serem silenciadas, não me está a ser fácil o silêncio que, do dentro delas, me chega, bem como a falta de sentir, de "apalpar". Contudo, eu deixei de estar na escola há apenas dois meses e, mesmo que fossem bastantes mais, não deixo, por isso, de conhecer bem e directamente o sistema educativo português desde os tempos da reforma Veiga Simão, conheço os efeitos das sucessivas políticas educativas, das reformas e das várias e diferentes medidas - efeitos na escola pública e no sucesso-insucesso dos seus alunos. Conheço directamente o crescimento das dificuldades e problemas resultantes da massificação do ensino no contexto das realidades sociais do nosso país e, acerca destas, as prioridades e não prioridades políticas, ou as vontades políticas e as faltas de vontade política. Conheço também directamente as sucessivas questões laborais e os comportamentos da classe docente face a elas, bem como as constituições dos sindicatos, evoluções e respectivas acções , tanto mais que não só sou a sócia número 198 do SPGL, como fui delegada sindical durante cerca de 20 anos consecutivos e me mantive, depois disso, muito atenta. E conheci ainda diferentes gerações de professores - não que cada geração seja uniforme, mas não deixa de ter alguma tipicidade -, e, nessas diferentes gerações, não deixaram de ter reflexos os respectivos modelos de formação-profissionalização.
Conheço essencialmente o ensino básico, tenho uma menor percepção do ensino secundário, mas ninguém negará esta afirmação: Não sendo suficiente para garantir a formação dos jovens portugueses, a sua preparação para a vida e o mundo do trabalho (especialmente nesta época em que devem ser preparados para uma contínua formação profissional, para uma constante actualização), não sendo suficiente, dizia, um sistema de ensino básico ou de escolaridade obrigatória de qualidade e exigência e que dê resposta adequada quer à época actual, quer às realidades sociais, tal é, indubitavelmente, condição necessária sem a qual ficará "aleijada" a restante escolaridade, ou a formação profissional subsequente.
Ora, se eu até já sinto falta de continuar no "terreno" para intuir efeitos das medidas da actual ministra da educação, como podem os cidadãos que não são nem nunca foram professores pronunciarem-se tão facilmente como o fazem sobre estas e aquelas medidas e distinguirem as válidas e adequadas das meramente hipócritas? E a pergunta maior é como podem os acólitos, fazedores da opinião pública ou influentes nesta, dormir de consciência tranquila depois de diligentemente propagarem as suas "análises" sem nada conhecerem directamente do referido "terreno"?
É verdade que, no estado em que está o país, serão necessárias algumas medidas ditas economicistas, mas o cidadão comum não aderirá de boa vontade a sacrifícios enquanto vê os escandalosos exemplos de tantos dos que mais podem. Como também os professores não aderirão, pelo menos com a mesma motivação, o mesmo entusiasmo e até com a paixão pelo ensino que caracteriza tantos, nem a medidas sobre as quais nem são ouvidos, impostas com recurso a uma "táctica" já reconhecida noutros países como erro colossal e que é a de denegrir a sua imagem, nem a justificações, em nome da educação-ensino para todos, que percebam eivadas de enorme hipocrisia.
E, já que referi reflexos dos modelos de formação de professores nas respectivas gerações, considero, por exemplo, também insólito o projecto de um exame para ingresso na carreira docente do ensino não superior quando prioridades economicistas já antigas alteraram uma formação inicial exigente quer na vertente científica, quer na vertente da profissionalização, juntando ambas no mesmo tempo de duração que tinha a primeira e retirando, para um ensino tão fundamental ao subsequente como é o do 2º Ciclo, a formação através da prática em estágios em que o professor se formava leccionando, sob orientação, turmas que para o efeito lhe eram atribuídas (para não falar das alterações propostas pela actual ministra aos estágios para 3º Ciclo e Secundário). Das duas, uma: Ou é de qualidade credível a formação ministrada pelas instituições formadoras, ou, se não é (ou nos casos em que não é) os governos não podem alhear-se disso por conveniências economicistas ou por compadrios e não podem deitar-se as responsabilidades exclusivamente para cima dos professores sem se exigir a responsabilização por parte das referidas instituições.
Não podem, em suma, ser compatíveis intenções de melhorar e adequar o sistema de educação e ensino com utilização do ensino público para amealhar tanto dinheiro quanto se consiga.
Que sabe a opinião pública em geral de tudo o que fui referindo em termos de reflexos na escola, na educação, no ensino? Que sabem disso tudo boa parte dos militantemente comentadores quer sobre a "bondade" desta ministra, quer sobre a "maldade" dos professores?
5 comentários:
Gostei particularmente deste teu post com alguma distanciação aparente.
Mostra como memórias soltas, duradouras e preciosas, nos podem esclarecer, se as usarmos no contexto real em que vivemos. Se tudo estiver imbuído dum projecto humanista.
Como eu gostaria de ler este teu texto num jornal diário dos ditos de referência.
Toda a gente sabe de pedagogia e de gestão escolar, ora não é?
Que é um professor? Nada!
Que é que ele faz na escola? Nada!
Que é que ele ensina? Ora não é nada?!
Então o que é que ele merece?
Nada!
Uma professora desiludida
A opinião pública sabe muita pouco da realidade escolar e o que sabe deve-se à visão deturpada que a comunicação social vai fazendo das escolas, realçando os maus exemplos e ignorando muito do que faz com os alunos nas nossas escolas...
Arrisco mesmo a dizer que nem os nossos governantes sabem o mínimo da realidade escolar dos nossos dias...
PS - Agradeço o elogio deixado na AULA DE GEOGRAFIA..
Denegrir a imagem pública dos professores (e atribuir-lhes as culpas todas) não é "estratégia" original, já foi usada noutros países, mas as consequências depressa se tornam visíveis.
Respondendo especialmente à Margarida (porque falou da desilusão), eu lembro o que, no fundo, todos sabem: O que é NADA é qualquer intenção de melhorar o sistema de educação-ensino sem contar com os professores, pois, sem eles, é que a Escola é Nada. E, pouco mais que nada será se tirarem aos professores o seu entusiasmo, por isso eu já tenho dito que é uma questão de esperar, de dar um tempo - que manter a confiança e vir a ver concretizarem-se esperanças muitas vezes tem esse custo, o da espera.
:)
Obrigada ic pelas palavras.
Preciso ouvir isso, mas quem tem já 32 anos de serviço e 54 anos de idade torna-se difícil esperar. Mas vamos esperar, sim!
Enviar um comentário