A Rita foi minha aluna nos 8º e 9º anos. Transitara com negativa em Matemática e declarou logo que detestava esta disciplina.
No 1º teste (realizado cedo e entregue em branco nas questões), escreveu: Não gosto de Matemática, detesto, odeio. Não estudo e ninguém me convence. Também não valia a pena, agora já não conseguia nada.
Retive a última afirmação – as outras não comentei, já lhas tinha ouvido. Retive porque, no meio da habitual assertividade dela, me pareceu uma daquelas frases com que o pensamento por vezes nos trai. (A Rita não era agressiva comigo, nunca tivemos má relação, o seu alvo era apenas a Matemática).
Embora sem deixar de ir falando com ela, deixei deliberadamente passar mais um pouquinho de tempo com a Rita alheada. Até ao dia em que lhe disse que devia ser uma tortura, dado que tinha que estar nas aulas, passar cada hora à espera do toque, sem poder conversar, apenas a fazer desenhos. E sugeri: Ao menos para não estares desocupada, porque não participas um pouco no teu grupo?
Creio que a Rita já estava a desejá-lo e que concordou com a sugestão porque não implicava nem “dar o braço a torcer” quanto ao seu "ódio", nem ficar em evidência o insucesso que ela antevia. E, a partir daí, teve uma atenção e um apoio meus muito intensos (era uma situação de desafio a mim mesma), a par da validação dos raciocínios correctos que fazia.
As turmas nestas idades são coesas, e os grupos na sala não precisam que o peçamos directamente para se empenharem também, numa espécie de conivência com o professor. A Rita (que tinha um aproveitamento suficientemente satisfatório nas outras disciplinas) começou, aos pouquinhos, a integrar-se, até chegar de vez em quando a intervir e a colocar dúvidas. Veio a aceitar também, finalmente, para recuperação de bases que lhe faltavam, alguma ajuda do padrasto, que algumas vezes ela dissera que sabia Matemática mas não a convencia a estudar.
Fim da “história”:
No ano seguinte (9º), um dia notei de longe que o grupo da Rita estava conversando, aparentemente distraído da tarefa. Ao começar a aproximar-me sem que dessem conta, ouvi a Rita, com o seu habitual tom assertivo: Não podemos estar distraídos, temos que puxar pela cabeça, a Matemática é uma disciplina muito importante, das mais importantes para nos desenvolvermos.
(Confesso que fiquei um pouco atónita, pois as minhas expectativas não tinham ido tão longe. Afastei-me sem mostrar ter ouvido - apenas contei à directora da turma).
A Rita terminou o 9º ano com um aproveitamento bastante razoável em Matemática e, por acaso, a área para que seguiu, após a habitual orientação profissional da psicóloga escolar, incluía Matemática no currículo do Secundário.
P.S. Também aqui acentuo: Ao professor cabe criar o “ambiente propício e um tudo-nada de confiança” (e às vezes aceitar desafios que, inicialmente, se colocam mais a ele do que aos alunos), mas depois, se eles dão uma volta de 180º, o mérito pertence-lhes.
No 1º teste (realizado cedo e entregue em branco nas questões), escreveu: Não gosto de Matemática, detesto, odeio. Não estudo e ninguém me convence. Também não valia a pena, agora já não conseguia nada.
Retive a última afirmação – as outras não comentei, já lhas tinha ouvido. Retive porque, no meio da habitual assertividade dela, me pareceu uma daquelas frases com que o pensamento por vezes nos trai. (A Rita não era agressiva comigo, nunca tivemos má relação, o seu alvo era apenas a Matemática).
Embora sem deixar de ir falando com ela, deixei deliberadamente passar mais um pouquinho de tempo com a Rita alheada. Até ao dia em que lhe disse que devia ser uma tortura, dado que tinha que estar nas aulas, passar cada hora à espera do toque, sem poder conversar, apenas a fazer desenhos. E sugeri: Ao menos para não estares desocupada, porque não participas um pouco no teu grupo?
Creio que a Rita já estava a desejá-lo e que concordou com a sugestão porque não implicava nem “dar o braço a torcer” quanto ao seu "ódio", nem ficar em evidência o insucesso que ela antevia. E, a partir daí, teve uma atenção e um apoio meus muito intensos (era uma situação de desafio a mim mesma), a par da validação dos raciocínios correctos que fazia.
As turmas nestas idades são coesas, e os grupos na sala não precisam que o peçamos directamente para se empenharem também, numa espécie de conivência com o professor. A Rita (que tinha um aproveitamento suficientemente satisfatório nas outras disciplinas) começou, aos pouquinhos, a integrar-se, até chegar de vez em quando a intervir e a colocar dúvidas. Veio a aceitar também, finalmente, para recuperação de bases que lhe faltavam, alguma ajuda do padrasto, que algumas vezes ela dissera que sabia Matemática mas não a convencia a estudar.
Fim da “história”:
No ano seguinte (9º), um dia notei de longe que o grupo da Rita estava conversando, aparentemente distraído da tarefa. Ao começar a aproximar-me sem que dessem conta, ouvi a Rita, com o seu habitual tom assertivo: Não podemos estar distraídos, temos que puxar pela cabeça, a Matemática é uma disciplina muito importante, das mais importantes para nos desenvolvermos.
(Confesso que fiquei um pouco atónita, pois as minhas expectativas não tinham ido tão longe. Afastei-me sem mostrar ter ouvido - apenas contei à directora da turma).
A Rita terminou o 9º ano com um aproveitamento bastante razoável em Matemática e, por acaso, a área para que seguiu, após a habitual orientação profissional da psicóloga escolar, incluía Matemática no currículo do Secundário.
P.S. Também aqui acentuo: Ao professor cabe criar o “ambiente propício e um tudo-nada de confiança” (e às vezes aceitar desafios que, inicialmente, se colocam mais a ele do que aos alunos), mas depois, se eles dão uma volta de 180º, o mérito pertence-lhes.
Sem comentários:
Enviar um comentário