_ Então como vai a escola?
_ Vai bem.
_ E a Matemática? Conta como vai!
_ Assim assim... é chata.
A mãe, aproveitando a oportunidade:
_ Ela tem teste para a semana...
_ Ah! Queres ajuda? Podemos fazer umas revisões...
_ Pode ser...
A I. é filha de uma amiga minha, tem 10 anos e anda no 5º ano. Comecei por pedir para ver o caderno para me "ambientar" com o professor dela. Pareceu-me muito vocacionado para treinar e treinar procedimentos e obrigar a cálculos e mais cálculos à mão, decerto para que os meninos não esqueçam as contas que aprenderam e não sofram os malefícios da calculadora, mas um bocado alheado daquela importante vertente que é a resolução de problemas. Lá fiz as revisões, mas quando quis fazer umas "variações" àquela monotonia repetitiva que vi no caderno tive algumas resistências da minha amiguinha I.: "Isso não sai no teste", "o meu professor não dá isso", "o meu professor nunca me fez perguntas dessas", "eu só tenho que saber fazer, não vou ter que explicar"...
O que será que impede um professor de perceber que está a tornar a matemática chatinha para as crianças? O que o faz perder a oportunidade de ter ele próprio mais gosto em ser professor? Motivar os alunos criando-lhes o gosto pelo 'jogo' de pensar e descobrir é uma tarefa aliciante e compensadora. É verdade que não é uma tarefa bem sucedida com todos os alunos, nem com todos se consegue até porque nenhum professor é perfeito, mas não me venham dizer que estas são questões de mérito profissional quando muitas vezes são, sim, problemas de demérito.
Voltando à minha aluna de momento, eu sei que ela gostava da matemática no 1º ciclo e a mãe agora está inquieta porque a vê perder o gosto. Mas não chega a estar na situação mais extrema do título deste post. Contudo, escrevi esse título porque, a propósito de falta ou perda de gosto pela matemática, veio-me à memória um caso que foi um dos (muitos) desafios da minha vida de professora - caso que aqui descrevi em tempos sob o título Rita e o ódio à Matemática. Esse ódio declarado da Rita foi ultrapassado, nesse empreendimento todos conseguimos ser bem sucedidos - os colegas de grupo, eu e ela (principalmente ela, como é óbvio). E confesso que esta memória não deixa de me fazer sentir alguma frustração ao observar agora a fase de perda de gosto da minha amiguinha I. pela matemática. E as suas resistências aos meus desvios às rotinas repetitivas do seu professor fizeram-me lembrar Rubem Alves numa entrevista em que a dada altura recorda quando queria ajudar a filha de 10 anos na resolução de problemas de matemática: propunha-lhe um caminho para resolver dado problema e a menina rejeitava dizendo que esse não era o caminho da professora. Pois... a minha amiguinha I. também tem que seguir os caminhos do seu professor até que mude de professor quando chegar ao 3º ciclo, e aí talvez se lhe abram outros caminhos...
P.S.
Peço desculpa se fui dura. Não pequei por personalizar pois o professor em questão é um anónimo entre outros e, se faço sempre questão de salientar uma verdade que é termos muitos e muitos bons professores, excelentes até, criativos e estimulantes, isso não quer dizer que omita que também há práticas estagnadas, monótonas e desmotivantes. Omitir tal nada contribui para mudar o que há a mudar, para melhorar o que há a melhorar. As referidas práticas levam a apelar a que os respectivos professores se tornem mais reflexivos, e essas práticas - elas sim - devem ser focadas no âmbito de uma avaliação formativa, para bem dos meninos e meninas que queremos que ganhem o gosto pelos desafios da matemática e pelo "jogo" do pensar.
8 comentários:
Tão, mas tão actual...
E triste. E sei bem do que dizes. E do prazer de os desafiar... e de os ver renascer nas conquistas.
Enfim...
Perfeito, perfeito era alguém perceber que há mais vida na escola para além dos papéis e dos objectivos e das avaliações que são de tudo menos do mérito que faz a diferença junto das crianças...
Muitos beijinhos
Isabel,
Como estás? Tenho andado um pouco “perdida, mas vou passando por aqui. Hoje apeteceu-me “dizer coisas” :)
Infelizmente, muitíssimos casos de “detesto a matemática” são culpa exclusiva do professor.
Aconteceu-me, no 6º ano do liceu, apanhar uma dessas professoras que transforma a matemática numa coisa árida e detestável. Não me conseguiu tirar o gosto, porque era profundo de mais para ser incomodado por um pormenor desses, mas conseguiu que a minha contribuição se resumisse apenas àquele 29, condição sine qua non…
Aconteceu com uma das minhas filhas, e com o resto da turma dela, que tinham um professor que adoravam e com quem tinham boas notas e que, no ano seguinte, foi substituído por uma professora execrável, que fez a turma deixar de gostar de matemática e que não satisfeita com isso, percebendo que os alunos gostavam do outro professor, passou o tempo a criticá-lo, perante eles, deixando-o pelas ruas da amargura. O problema é que, por mais que eu (e o avô e a tia) tentasse, não consegui que ela voltasse a gostar de matemática. E o grave é que matemática era disciplina nuclear para o curso que queria desde pequenina.
Por outro lado, a minha irmã, teve uma turma em que os pais fizeram queixa dela porque os explicadores se queixaram que ela dava coisas que não vinham no programa. As coisas estranhas que ela dava e não vinham no programa, eram aquelas coisas divertidas que são “aqueles pequenos grandes truques que nos ajudam a resolver problemas”.
Olá Maria Lisboa :)
Obrigada pelos testemunhos. Custa referir certos casos, mas é uma verdade que, se há muitos professores que são um bem para os alunos, também há outros que são um mal. E não é com o modelo da ADD de MLR que os últimos se vão modificar. A avaliação tem que ser formativa e com confiança dos avaliados nos avaliadores, além de que também é preciso que cada professor aceite rever a sua prática.
Enfim... como disse a 3za, é triste - são tristes as situações em que os alunos podiam ter gosto pela matemática e acabam por detestá-la por falta da necessária sensibilidade do professor.
Coitadinha da criança que teve de mecanizar uns cálculos. Fica traumatizada para o resto da vida.
Já as suas aulas cooperativas deram um lindo resultado... uma balburdia sem tamanho. Eu estava lá e vi. Não aprendi nada.
As minhas aulas terão tido muitos defeitos, mas balbúrdia, desculpe lá, isso não. Lamento que não tenha aprendido nada (já agora... 'balbúrdia' escreve-se com acento). Estranho é que acusações sejam sempre anónimas.
Pois tiveram, como as aulas de todos os professores. E o maior deles é essa sobranceria com que escreve acerca de outros métodos que não são os seus. Podia aproveitar este blogue para fazer introspecção (com til). Essa conversa das aprendizagens "motivadoras" e "pela descoberta" não passa de um chavão ideológico que disfarça outras coisas altamente totalitárias. E esse totalitarismo ve-se bem pela forma como falou das aulas desse professor. Os métodos que ele usa são tão ou mais válidos que os seus. Mas a Isabel escreve sobre eles com uma suposta superioridade moral, como se aquilo que aqui defende tivesse algum tipo de sustentação pedagógica, e os métodos desse professor não.
O que acho ainda mais curioso é que protamente aponta defeitos a esse seu colega, mas provavelmente nunca os apontou aos seus amigos do PC que andaram pelas escolas ao longo de anos sem fazer nenhum.
Quando ao motivo dos comentários serem "anónimos", só o são porque a Isabel o permite. Pode não os públicar.
"Publicar" sem acento. Quem está familiarizado com a postagem, não faz correcções ortográficas aos comentadores. Toda a gente sabe que a postagem é muitas vezes escrita de rajada sem haver uma correcção da escrita.
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