segunda-feira, julho 31, 2006

Como se continuasse ausente...

Regressar a casa, regressei - e começo por agradecer os votos de boas férias que me deixaram. Mas entrei e o meu computador saiu, que desta vez os seus desatinos precisam de tratamento de perito, e neste emprestado parece que estou numa caixa vazia!
Nestas duas semanas não li jornais, não li artigos, não li posts, no que respeita a notícias limitei-me a um telejornal diário. E, se o mundo se confinasse a este país que tão medíocrezinho anda, nem perderia nada relevante se nem a TV ligasse - ver a triste prestação de Maria de Lurdes Rodrigues na sua ida ao Parlamento esteve dentro das expectativas já rotineiras e, quanto às cenas dos exames, quem ainda se espanta com repetições de remediação ou com perguntas ambíguas que até professores põem a discutir??
Mas, este país não é o mundo, e, no mundo, está a acontecer a agressão de uma potência militar sobre uma população de outro país - sim, eu digo assim, a comunicação social diz de outras maneiras, ou só diz Israel e o Hezbollah, o Hezbollah e Israel, parece que sumiu das bocas e das mentes a história do conflito israelo-árabe (história que não se confina à causa original), que o que é preciso é que o mundo aceite sem demasiada indignação imagens como esta, que recolhi aqui.

Este cantinho não costuma ter imagens assim, além de que é de memórias de professora. Mas ando ausente dessas memórias, ando farta de uma comunicação social quase acrítica, voz das conveniências dos senhores do mundo e de seus formais aliados, subserviente ao papel dela esperado de fazedora das cabeças ocidentais. Ando também a começar a perder algum gosto ou sensação compensatória de, apesar de tudo, pertencer a uma comunidade europeia esperada como preservadora de valores mas que, afinal, ao invés de se distinguir ou diferenciar, embarca nas águas desse poder que (por enquanto) estende pelo mundo os seus tentáculos gananciosos sem que a boca de outras nações (inclusive a que somos) pronuncie o termo terrorista ou o epíteto criminoso, como se as expressões com que intitulam o parceiro americano e se auto-intitulam - mundo civilizado, mundo democrático - concedessem por si só a imunidade. Agitar a bandeira de combate ao terrorismo ou a qualquer grupo que chacina civis indefesos é, indiscutivelmente, defender direitos humanos. Todavia, é preciso algum 11 de Setembro que ponha na visão dos possíveis outros atentados algures, perto, sobre as próprias cabeças, para se recuperar a capacidade de indignação que o quotidianozinho razoavelmente seguro que se vai vivendo faz, de facto, ir perdendo, num quase fechar de olhos a outras formas de terrorismo, belicistas quando as mais disfarçadas não chegam, mas mais geralmente invisíveis, subterrâneas, com as quais o interesse próprio e a ganância do poderio económico tornam ou mantêm num inferno a vida de povos, pois mesmo sem guerra se vive o inferno da fome ou o sofrimento da exploração ou a humilhação de governações fantoches e subservientes.
A meu ver, Israel, neste momento, está a ser uma gota de água (mas uma gota chega para fazer transbordar um copo) a que o Hezbollah serve de pretexto. E as causas perdem a sua justiça a partir do momento em que de vítima se passe a vitimador e outros interesses viciem o que foram outrora causas justas. Israel já teve oportunidades de rasgar o seu papel de vítima, neste momento só lhe consigo vislumbrar a hipocrisia filiada nessa outra hipocrisia maior que todas, sob a qual se processa (até quando, está por ver) a "democrática" supremacia americana. E é desta que estou farta, é sob os seus tentáculos que tenho sentido o mundo, apesar de saber que outros tentáculos se poderão constituir, apesar de ser pequena (embora persistente) a esperança de que alguma vez a humanidade descubra um caminho de libertação - libertação de si mesma, superação de uma parte da sua própria natureza?

Como disse acima, este cantinho não costuma exibir imagens como essa com que a ele regresso. Mas, as memórias de professora andam distantes, também não quero apagar este blogue para iniciar um com outro nome, acho, pois, que pus o título adequado nesta reentrada - sinto-me como se continuasse ausente...

5 comentários:

tsiwari disse...

Sáo recentes...mas há memórias recentes.

Estás aposentada, já. Mas continuas a ser professora.

Assim, modus ponen (será este?), são memórias de prof.

Tristes, é certo. Mas nem só de alegrias vivemos.

Até ao meu regresso, um beijo.

matilde disse...

Isabel, as imagens mais ou menos chocantes, infelizmente não são mais que a realidade... e virar-lhes a cara é talvez um desrespeito por todas as vítimas destas birras tão sem sentido...
É bom sacudirmo-nos um pouco e acordar para o que acontece no mundo, mas, sem nunca perder de vista o lado de quem acolhe, de quem ajuda, de quem dá tantas vezes a vida por outras vidas... Talvez sejam bem mais que os outros, que tanto se esforçam por tirar essas vidas...
Bjo e... bem vinda ;)

IC disse...

Pois, Tit, não se perde de vista os que acolhem, ajudam e até dão as vidas por outros e é bom pensar que talvez sejam mais, mas a questão é que esses não têm o poder e, nos tempos actuais, as vidas de povos não mudam com mudanças ou revoluções nos seus países. O princípio da não ingerência perdeu o sentido, não só há ingerências bélicas descaradas, como, sobretudo, há a ingerência velada do poder económico, a dependência é um facto e o fosso entre a riqueza e a miséria, entre o bem estar e o sofrimento não é transponível por, sequer, maiorias - no neoliberalismo desenfreado tal não faz parte das prioridades dos que teriam capacidade para o transpor ou diminuir. A globalização tem um preço, para o bem ou para o mal, e já não é possível ficarmos pelo nosso mundo próximo, estamos todos dentro dela.
Enfim... tenho é que voltar às memórias de professora (embora o Tsiwari diga que tudo são memórias de professora porque eu continuo professora) :)

a d´almeida nunes disse...

Quem é que pode ficar indiferente a estas imagens e todas as que estão a entrar pela nossa casa dentro, a todo o momento, nós a sentirmo-nos privilegiados por ainda termos as nossas, prontinhas para lá entrarmos, lá estarmos, lá dormirmos descansadamente, sem sequer pensarmos que bastaria um simples "erro" técnico dos sistemas de orientação electrónica dum míssil para as transformar num amontoado de cimento e ferro e corpos ensanguentados/inertes...
Custa, custa muito.
"In God we trust". Não se pode levar o "Deus" da Bíblia à letra dos Profetas (Maiores e Menores) e, muito menos, à dos dólares.
António - dispersamente...
via 3za

Anónimo disse...

Este blogue não foge è regra de muitos: utilizam as mortes de um bombardeamento para fazer propaganda política e atacar o Estado de Israel.
Não estava à espera de chagar aqui e ler isto. Mas se calhar se formos a ver bem, não é assim tão estranho.
Mais uma vez me espanto com a total ausência de criticas a uma organização que faz uma guerra no meio dos civis e os usa como escudos. Nem a palavra a condenar o Hezbolah e a perda de vidas no lado Israelita.
Cada um tem a sua visão do mundo, mas ao menos já que vão mostrar corpos despedaçados, mostrem dos 2 lados, ou então, assumam claramente as preferencias e deixem-se de conversa piedosa.