quarta-feira, novembro 16, 2011

Deixo um poema...

O homem que contempla


Vejo que as tempestades vêm aí

pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos,

batem nas minhas janelas assustadas

e ouço as distâncias dizerem coisas

que não sei suportar sem um amigo,

que não posso amar sem uma irmã.



E a tempestade rodopia, e transforma tudo,

atravessa a floresta e o tempo

e tudo parece sem idade:

a paisagem, como um verso do saltério,

é pujança, ardor, eternidade.



Que pequeno é aquilo contra que lutamos,

como é imenso, o que contra nós luta;

se nos deixássemos, como fazem as coisas,

assaltar assim pela grande tempestade, —

chegaríamos longe e seríamos anónimos.



Triunfamos sobre o que é Pequeno

e o próprio êxito torna-nos pequenos.

Nem o Eterno nem o Extraordinário

serão derrotados por nós.

Este é o anjo que aparecia

aos lutadores do Antigo Testamento:

quando os nervos dos seus adversários

na luta ficavam tensos e como metal,

sentia-os ele debaixo dos seus dedos

como cordas tocando profundas melodias.



Aquele que venceu este anjo

que tantas vezes renunciou à luta.

Esse caminha erecto, justificado,

e sai grande daquela dura mão

que, como se o esculpisse, se estreitou à sua volta.

Os triunfos já não o tentam.

O seu crescimento é: ser o profundamente vencido

por algo cada vez maior.

Rainer Maria Rilke
(Via Amélia Pais)

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