Canta, poeta canta!/Violenta o silêncio conformado/Cega com outra luz a luz do dia/Desassossega o sossegado/Ensina a cada alma a sua rebeldia - Miguel Torga
Os economistas, que deveriam ter conhecimento e lucidez, não se entendem (ou não querem entender-se). E os opinadores para todos os gostos fazem um barulho ensurdecedor.
O povo português é atordoado pelas chantagens das ditas inevitabilidades e pelas estratégias do medo, restando-lhe difíceis intuições e a pergunta: será que o destino do país está entregue a governantes competentes, ou não são estes mais do que irresponsáveis atrevidos que quiseram governar sem estudo e sem abertura à ponderação de propostas alternativas a medidas que tomem para além do compromisso com a dita troika?
Sinceramente, já só sou capaz de escrever o que agora escrevi no topo deste blogue.
(Quanto à Europa, esse é também um problema aflitivo e primordial. Contudo, vamos tendo um governo empenhado em ser mais papista do que a papista-troika)
... as consequências podem ser irreversíveis por muito tempo!
«A despesa pública em educação em percentagem do Produto Interno Bruto, prevista para 2012, vai empurrar Portugal para a cauda da União Europeia.
De 5% do PIB em 2010, as despesas do Estado com a educação passarão a representar apenas 3,8%. Na UE, a média é de 5,5%. Na Eslováquia, que estava no final do tabela, rondava os 4%.
A descida deste indicador estrutural é apresentada na proposta de Orçamento do Estado para 2012.»
E enquanto Vitor Gaspar continua a guiar-se pela sua fé no "deus mercado", Nuno Crato já não se guia por coisa nenhuma, restando-lhe uma fé abstrata e irracional...
«Questionado por jornalistas, em Braga, o ministro Nuno Crato escusou-se a pronunciar-se em concreto sobre os cortes previstos no orçamento do seu ministério, mas considerou que as opções do Orçamento do Estado para 2012 são "as melhores" face ao "momento difícil" que o país atravessa. "São opções difíceis, vivemos um momento difícil, mas eu creio que são as melhores opções face à situação em que estamos", disse. "Temos todos esperança no futuro, na educação, na ciência, vamos ultrapassar este momento difícil, vamos de certeza conseguir ultrapassá-lo", acrescentou.»
Demita-se, Senhor Ministro Nuno Crato! As intenções que propagou não nos fazem falta nenhuma, mas, ao menos, mostre alguma dignidade recusando ser mero "pau-mandado".
Li que argumentou na defesa do corte da carga horária das disciplinas de História e Geografia que elas não são estruturantes. Olhe que a Matemática também pode não ser para "brilhantes" alunos, como parece ter sido o caso de V. Excia.
"Não se entreguem a esses homens artificiais, homens máquina com mente e coração de máquina. Vocês não são máquina, vocês não são desprezíveis. Você é homem.(...) Vocês, as pessoas, têm o poder (...) Então, em nome da democracia, vamos usar esse poder, vamos todos nos juntar! Vamos lutar por um mundo novo!"
(Não me lembro se não será a segunda vez que trago aqui este episódio, mas hoje um email recordou-mo)
A Itália festejava o 150º aniversário da sua unificação e uma das muitas comemorações da importante data decorreu na Ópera de Roma, com a apresentação da obra Nabucco, dirigida por Ricardo Muti. Antes da apresentação, Gi anni Alemanno, prefeito de Roma, subiu ao palco para pronunciar um discurso denunciando os cortes no orçamento dirigido à cultura que haviam sido feitos pelo governo (apesar de Alemanno ser membro do governo e amigo de Berlusconi). Esta intervenção política num momento cultural dos mais simbólicos para a Itália produziria um efeito inesperado, ao qual Berlusconi, em pessoa, foi obrigado a assistir.
Quando o coro chegou ao fim do famoso canto Va Pensiero, ouviram-se vários pedidos de bis, começaram os gritos de Viva Italia e Viva Verdi e as pessoas nas galerias atiraram pequenos papéis escritos com mensagens patrióticas. Então,
Muti voltou-se para o público - e para Berlusconi - e disse:
"Logo que cessaram os gritos de bis, vocês começaram a gritar Longa Vida à Itália. Sim, estou de acordo com isto: Larga vida à Itália. Mas... Já não tenho trinta anos e vivi minha vida. Percorri o mundo e, hoje, tenho vergonha do que acontece no meu país. Por isso, vou aceitar os vossos pedidos para apresentar Va Pensiero novamente. Não só pela alegria patriótica que sinto neste momento mas, sim, porque enquanto dirigia o coro que cantou Ai meu país belo e perdido pensei que, se continuarmos assim, vamos matar a cultura sobre a qual erguemos a história da Itália. E, nesse caso, nossa pátria também estaria bela e perdida. (...)
(Deram-lhe só sete minutos... teve que ler. Na TV, não sei se lhe dedicaram alguns... não me espanta se dedicaram zero... as verdades e a lucidez não são nada "convenientes"!)
Embora Mia Couto já tenha sido galardoado com vários prémios literários, li a notícia e vim direita aqui ao meu cantinho. Porque Mia Couto e a sua obra literária fascinam-me.
E, enquanto o novo acordo ortográfico me exaspera, sabe-me bem recordar como Mia Couto, ao contrário de desvirtuar a Língua Portuguesa, mas usando tanto o léxico de regiões moçambicanas, a enriquece, como que a recria de uma forma extasiante.
Identidade
Preciso ser um outro
para ser eu mesmo
Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta
Sou pólen sem insecto
Sou areia sustentando
o sexo das árvores
Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro
No mundo que combato
morro
no mundo por que
nasço
Setembro de 1977. In Raiz de Orvalho e Outros Poemas, Ed. Caminho, 1999
O Henrique Santos regressou com novos blogues dedicados ao basquetebol. Mas, a seguir, regressou também ao seu blogue Educrítica, com o que fiquei muito contente.
Claro, o basquetebol é importante, o meu neto pratica-o e ainda bem, significa que pratica desporto, tão importante na sua idade (e não só), mas destaco o regresso do Henrique ao seu antigo blogue porque a Educação no sentido mais global até faz bastante ruído na blogosfera, mas não é desse ruído que precisam a nossa Escola Pública e a Cultura que desejamos ver transmitida aos nossos jovens.
Há poucas semanas encontrei-me com duas amigas, mãe e filha, encontro onde conheci o recente marido da última. Nessas coisas que se dizem em apresentações, a mãe mencionou-me como tendo sido "professora" de Matemática da I.
Entre aspas, pois não fui professora da I. Apenas a acompanhei quando, com 11 anitos, começou a vir a minha casa porque a mãe estava preocupada não só com o muito pouco gosto da I. pela Matemática, como também com a professora, com formação para a lecionação de Ciências e pouco dada ao ensino da referida disciplina.
E a I. (agora já na casa dos 30) aqui continuou a vir até meados do seu 10º ano, em que já ia longe o tempo da nota positiva "pequenina". E ainda bem que esse tempo ia longe, pois precisou de alta média em Matemática para o curso que seguiu.
Até aqui, nada de especial nesta estória. Mas, o que foi especial, o que foi não digo revelação, mas alguma surpresa, foi a I. ter-me dito: "Sem dúvida que mudaste a minha vida, e sei isso bem; eu detestava a Matemática e hoje é com ela que lido todos os dias".
Não, não fui eu, foi ela, pois o mérito do trabalho e da responsabilidade foi dela desde pequenita. Contudo, ainda agora estou a vê-la ali na mesa comigo, e a ouvi-la logo num dos primeiros dias em que cá veio, 11-12 anitos: "Ah! Que engraçado! Nunca me tinham explicado isso assim!" Como também ainda me lembro que foi essa expressão "que engraçado" que me fez logo pensar que não ia ser difícil mudar a sua aversão à matemática em gosto.
Por favor, não deixem avançar a ideia dos professores generalistas para o 2º Ciclo! Sendo muito importante um bom 1º Ciclo, não deixa de ser verdade que é no 2º que verdadeiramente se inicia a Matemática, e que este ciclo pode ser decisivo para o bem ou para o mal do futuro de muitos alunos.
Passando os olhos pelas capas dos jornais (que recebo no mail), hoje noto mais uma vez habituais critérios divergentes nos títulos das notícias, consoante as 'tendências' dos jornalistas ou dos respectivos orgãos de "informação".
«FMI: Buraco na Madeira força revisão da ajuda a Portugal» (Diário Económico)
Tenho um grande amigo, que não é autor de blogue, que me critica por agora escrever muito pouco, por agora denunciar muito pouco...
Talvez tenha alguma razão, dado que escrevi muito no tempo de MLR e rebati muito a sua política educativa apoiada por José Sócrates. Mas, nessa altura, este meu cantinho centrava-se essencialmente nas questões da Educação. Ora, acontece que, no actual momento, por mais que me preocupe o rumo da Educação, o meu pensamento, as minhas preocupações, os meus desgostos e as minhas revoltas não conseguem isolar um pouco a política educativa porque a global é (para mim) demasiado triste, preocupante, revoltante e destituída de qualquer boa perspectiva.
A minha esperança (que nunca perco) passou para longo prazo.
Há, sim, alternativa ao actual rumo (e esse é o meu grito, que não preciso de repetir pois permanece bem "audível" aí no topo do meu blogue). Mas não basta haver alternativa: É precisa uma lucidez generalizada, que não existe; é precisa uma tomada de consciência muito ampla, que gere aquela Liberdade que Marx definia como "a consciência da necerssidade"; é preciso que o povo português deixe de ser matraqueado por comentadores que o alienam ou lhe instalam o medo a fim de que permaneça dócil perante os verdadeiros objectivos do neoliberalismo exacerbado; é preciso, muito provavelmente, que também os outros povos da Europa gritem em uníssono um enorme NÃO aos senhores que comandam, nomeadamente os povos que até deram o poder aos mais soturnos líderes (como também cá, com a diferença que os líderes de cá nada mandam, apenas são subservientes, com gosto e crença).
O que tenho respondido ao meu amigo? Tenho respondido que a minha escrita não tem visibilidade, pelo que não faz sentido andar a repetir mais do mesmo. Não que não seja preciso que as vozes imprescindíveis, as que conseguem ter alguma audição, não se cansem de repetir mais do mesmo enquanto for sempre mais do mesmo (e sempre a somar) os actos governamentais a denunciar. Quanto à minha quase invisível pessoa, quem por aqui passar que ouça o meu grito aí acima. E, se quiser saber o que penso, o que denuncio nos últimos tempos de poucos escritos (poucos, saliento, não só no tempo mais recente de novo governo ), pois tem as "etiquetas" aí ao lado, é só clicar nas de "política" que logo fica disponível o meu pensamento.