Acabo de regressar da Praça de Espanha. Em defesa da Cultura, manifestação? protesto? espetáculo de oito horas? Eu diria apenas que a poesia, a canção, as artes - a cultura - (também) sairam à rua.
Trago nos ouvidos e no espírito o ACORDAI, cantado depois de dito em seis línguas por declamadores dos respectivos países. Trago também a Grândola, a terminar após o Acordai.
Eu sei que já não posso ter a certeza de não morrer como nasci - em ditadura. Mas, na verdade, tenho vivido e sentido, nas últimas semanas, ambientes em que se sente um cheiro a vésperas de novo Abril.
Não me lembro (perdoem-me se a memória me trai), não me lembro de, depois do 1º de Maio de 1974, sentir o povo português assim. O povo em geral, o povo que então ainda não tinha partido e agora está farto de partidos - dos partidos que nos têm governado pondo a proteção dos interesses dos grandes lobbies e, tantas vezes, os seus próprios interesses eleitorais acima dos interesses do povo português e dos valores da Pátria.
Talvez um governo de homens e mulheres de sólidos, corajosos e incorruptíveis ideais de justiça e de humanismo seja utopia. (Embora..."Se as coisas são inatingíveis... ora! / não é motivo para não querê-las. / Que tristes os caminhos, se não fora / a mágica presença das estrelas!")
Mas não é exigir muito clamar por um governo ao menos de homens e mulheres patriotas, lúcidos, estudiosos e experientes que urgentemente substituam a submissão, o culto cego e insensível dos números e o atabalhoamento que caracterizam a actual governação (para não usar outros termos).
Assim o povo português queira. Assim o povo português não esqueça as palavras que mais têm sido gritadas ultimamente: O Povo é quem mais ordena.