quarta-feira, novembro 30, 2011

Nas mãos dos professores - provocações à reflexão I

Nota prévia
Os professores estão tristes, como triste está o país. Mas a força do ser humano reside em não desistir. E as nossas crianças e adolescentes precisam de quem não desista deles.
Derrotismo e individualismo abafam a consciência do poder que têm os professores em união e colaboração. Tal como boas medidas políticas para a Educação nenhum efeito teriam sem os professores, também as medidas que desprezam as crianças e jovens sem possibilidade de prescindir da Escola Pública não têm, por si, o poder de impedir o papel do professor e a sua relação com os alunos na sala de aula.
Como  todos os que trabalham, os professores sofrem o roubo prepotente de direitos remuneratórios e o agravamento das condições de exercício da profissão. Mas há duas maneiras de enfrentar as dificuldades. Uma é cada um fechar-se em si mesmo numa rotina entediante dos dias feitos dos gestos obrigatórios; outra é não abdicar da ação que dá sentido à vida e à esperança.
Mais que nunca, os professores que não desistem dos seus alunos são, para as crianças e adolescentes, os imprescindíveis. 

Provocações à reflexão - I

sábado, novembro 26, 2011

...

Os povos serão cultos na medida em que entre eles crescer o número dos que se negam a aceitar qualquer benefício dos que podem; dos que se mantêm sempre vigilantes em defesa dos oprimidos não porque tenham este ou aquele credo político, mas por isso mesmo, porque são oprimidos e neles se quebram as leis da Humanidade e da razão; dos que se levantam, sinceros e corajosos, ante as ordens injustas, não também porque saem de um dos campos em luta, mas por serem injustas; dos que acima de tudo defendem o direito de pensar e de ser digno.

Agostinho da Silva, in Diário de Alcestes


Eu não quero ter poder
Mas apenas liberdade
P'ra dizer aos do poder
O que entendo ser verdade

Agostinho da Silva

sexta-feira, novembro 18, 2011

De vez em quando o meu copo transborda

e, embora nunca pense em terminar de vez com este cantinho, lá volto a suspendê-lo por tempo indeterminado pois não há paciência para escrever - fica, sim, a impaciência na espera de ver a resistência sair à rua (não ver apenas, sair também, claro), sair à rua e voltar a sair, mais e mais, e não só por parte do meu povo, que isso agora talvez não baste, mas resistência dos povos unidos, que urge.

A "gota" de água que hoje fez transbordar o meu copo:
Enquanto isto, e enquanto se tiram às pessoas direitos adquiridos como são os seus salários, que esses acha o governo e acha a maioria dos senhores deputados que é só decretar "cortem-se" ao mesmo tempo que, pelos vistos, pensam "mas a mim não". Pelos vistos, sim: A reintegração dos deputados na vida civil irá custar aos cofres públicos, até ao final de 2012, mais de 800 mil euros. Porque para esses senhores deputados direitos adquiridos para si próprios são intocáveis, e a lei que revogou em 2005 o dito subsídeo de integração para todos os seus colegas seguintes não os atinge porque "já tinham adquirido esse direito".
Não contesto, mas dizer, digo, digo que eu teria vergonha de solicitar o tal apoio de integração (e resta saber se precisaram de algum apoio para retomarem a sua anterior actividade profissional). Mais:
E outros 11 antigos deputados pediram a concessão da subvenção vitalícia.
Nota: A Assembleia da República pediu à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) um parecer sobre a divulgação dos nomes dos beneficiários do subsídio de reintegração e da subvenção vitalícia. Pois eu não quero saber nomes, que isso acho feio. Só gostava que houvesse o exemplo da moralidade, e para não falar de uma coisa bonita que se chama solidariedade.

E, antes de deixar este cantinho a marinar até me voltar a paciência, retomo a notícia do início. Gota de água? A mim não se afigura gota apenas. Talvez porque sou de um tempo que nem o actual ministro da educação, nem o das finanças, nem o primeiro sofreram. De um tempo em que, se pertenci à elite dos que então puderam estudar e prosseguir estudos, não foi por "berço" mas sim pelo enorme sacrifício dos meus pais - um sacrifício que, apesar de tudo, conseguiram mas não bastava para muitos e muitos. E quando, agora, já estou a saber do grande aumento de desistências de alunos que conquistaram o acesso ao ensino superior, isto transborda-me de facto o copo em que tento não fazer comparações com um passado morto - morto, mas com fantasmas que ressuscitam.   


quarta-feira, novembro 16, 2011

Deixo um poema...

O homem que contempla


Vejo que as tempestades vêm aí

pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos,

batem nas minhas janelas assustadas

e ouço as distâncias dizerem coisas

que não sei suportar sem um amigo,

que não posso amar sem uma irmã.



E a tempestade rodopia, e transforma tudo,

atravessa a floresta e o tempo

e tudo parece sem idade:

a paisagem, como um verso do saltério,

é pujança, ardor, eternidade.



Que pequeno é aquilo contra que lutamos,

como é imenso, o que contra nós luta;

se nos deixássemos, como fazem as coisas,

assaltar assim pela grande tempestade, —

chegaríamos longe e seríamos anónimos.



Triunfamos sobre o que é Pequeno

e o próprio êxito torna-nos pequenos.

Nem o Eterno nem o Extraordinário

serão derrotados por nós.

Este é o anjo que aparecia

aos lutadores do Antigo Testamento:

quando os nervos dos seus adversários

na luta ficavam tensos e como metal,

sentia-os ele debaixo dos seus dedos

como cordas tocando profundas melodias.



Aquele que venceu este anjo

que tantas vezes renunciou à luta.

Esse caminha erecto, justificado,

e sai grande daquela dura mão

que, como se o esculpisse, se estreitou à sua volta.

Os triunfos já não o tentam.

O seu crescimento é: ser o profundamente vencido

por algo cada vez maior.

Rainer Maria Rilke
(Via Amélia Pais)

domingo, novembro 13, 2011

sexta-feira, novembro 11, 2011

Por medidas mais justas...

Para cortar nos salários não é precisa coragem - basta ter uma maioria absoluta. Para medidas menos injustas basta coragem para não ceder às pressões dos interesses graúdos. E, mesmo que medidas mais justas não cheguem, valeria a demonstração de sentido de moralidade.

quarta-feira, novembro 09, 2011

Uma síntese simples mas lúcida

«A União Europeia está a esboroar-se e os sábios discutem o sexo dos anjos. Anteontem, saímos aterrados do programa Prós e Contras. A questão já não é de ficar ou não ficar no euro. A questão é de sair e de como sair. Mas qualquer das portas conduz-nos à desgraça. Não conseguimos evitar as armadilhas da violência e da miséria, e a emocionante ideia dos "fundadores" do projecto está posta de lado. Politicamente, a União não existe; a solidariedade, imaginária; e o desenvolvimento económico caracterizado pela supremacia da Alemanha sobre todos os outros países. Sem esquecer que o nacionalismo ressurge com uma força inesperada e que a extrema-direita manifesta assustadoras práticas de reprodução.

A Europa das nações foi um mito, nascido das exigências pessoais e morais de alguns homens que haviam sofrido duas guerras. Há qualquer coisa de poético neste almejo; mas há, igualmente, algo de impraticável. O caso da Grécia é, somente, um incidente à espera de acontecer. Resulta de diferenças culturais e de opostas concepções políticas. Uma comunidade não é sinónimo de exclusão e de pobreza, se os seus dirigentes souberem e quiserem controlar as diversidades. A União nasceu desse equívoco. Afinal, não somos todos diferentes e todos iguais. Opuseram-se-lhe não só a subjectividade dos protagonistas políticos como a nova e tumultuosa ordem económica e uma juventude distanciada de uma definição comunitária.

Torna-se pungente assistir aos salamaleques de Pedro Passos Coelho ante os senhores do mando, e o afã com que se apressa a ser um zeloso cumpridor das ordens emanadas de fora. Há um défice de dignidade e de orgulho que a desenvoltura do primeiro-ministro não consegue dissimular, e se espelha, afinal, em todos nós. O conceito de inferioridade nasce daquele que se considera como tal. E esse conceito, levado ao limite, transforma num ser alienado aquele que a isso se submete. Se a Grécia expressou uma auto-afirmação simbólica, logo os países que se encontram na mesma linha de dificuldades demonstraram uma animosidade clara. A assimilação do medo faz parte das desigualdades de que a União é cada vez mais fértil.

Portugal, este Governo, exclui qualquer alternativa que abandone as regras impostas de fora. Todas as possibilidades que se combinem entre si são imediatamente eliminadas, numa lógica de alienação e de negação que chega a ser repugnante. Nada nos diz que a situação melhore nos próximos anos. Independentemente da vontade dos povos, dos protestos que façamos, das indignações que protagonizemos, das censuras que lavremos, os poderes que nos amarram são extremamente poderosos. Os estorvos que consigamos causar não chegam para alterar o projecto passadista e profundamente reaccionário que está em curso.»