quarta-feira, novembro 30, 2005

Achei...

Graças ao Miguel Sousa, achei o blogue Ao Longe os Barcos de Flores, de Amélia Pais.
Um blogue que me deu a sensação de ser um poema à poesia.

...

(...)

Que o poema seja microfone e fale
uma noite destas de repente às três e tal
para que a lua estoire e o sono estale
e a gente acorde de novo em Portugal.

(...)

Que o poema diga o que é preciso
Que chegue disfarçado ao pé de ti
e aponte a terra que tu pisas e eu piso
e que o poema diga: o longe é aqui.


Manuel Alegre, Poemarma (Extracto)

terça-feira, novembro 29, 2005

Tempo de desencanto

Mal escrevi este título, o meu blog entregou-me um pré-aviso de greve, diz que é de protesto, e na assinatura leio Memórias. Vou ter que passar uns dias em negociações com ele (ou com elas?).

Ainda por cima, vou ter que andar em negociações comigo mesma, pois na semana passada mais uma caterva de papelada (leia-se "tempo para mais nada" ou "roubo do tempo que seria importante") fez-me voltar costas depois de roubar um papel que ainda estava em branco, cheia de vontade de escrever nele o meu pré-aviso de greve ilimitada.

E ainda por cima de tudo, as minhas turmas vão fazer teste e eu já só tenho uma aula com cada uma para as últimas negociações sobre a atenção, a mente solta e umas coisitas em que tenho andado às teimas com alguns ... negociações que são outras e não podem ser prejudicadas por conflitos com desencantos.

segunda-feira, novembro 28, 2005

Versus Admirável Mundo Novo

Este caminho
Ninguém já o percorre,
Salvo o crepúsculo.

Bashô Matsuo

Ah, o passado,
O tempo onde se acumularam
os dias lentos.

Busson


Josef Danhauser (1845), A Family Resting At Sunset
(Imagem reduzida, clicar)

A normalidade é tão somente uma questão de estatística.
Aldous Huxley

sábado, novembro 26, 2005

Sugestão de leitura

Sou insuspeita, pois, numa fase em que me chamou a atenção o pensamento de Olga Pombo, senti discordâncias com algumas das suas ideias.
Acabei de encontrar por acaso um endereço, uma referência a um seu texto, num dos tantos comentários a posts na blogosfera (comentário apenas identificado como anonymous) Trata-se de um texto longo, mas que sugiro como a não perder, mesmo que se concorde aqui, se concorde menos ali e não se concorde acolá. É um texto que permite multiplicar-se em várias reflexões/discussões bem pertinentes.
Transcrevo apenas algumas afirmações soltas, de modo nenhum na ideia (que seria redutora e incorrecta) de sintetisar as ideias de um texto que aborda e coloca muitas questões, mas como meras "motivações" para a sua leitura, também para as controvérsias que suscite mas que, a meu ver, por isso mesmo inovam e dinamizam a nossa reflexão.


(...) no nosso mundo de hoje, uma das funções mais silenciadas da escola, mas nem por isso menos incontornável, é a de tomar conta dos filhos enquanto os pais vão trabalhar. (...) Estamos pois perante uma situação terrível - a mais terrível de todas, a meu ver - a progressiva e alarmante transferência para a escola das responsabilidades educativas que, naturalmente, e desde sempre, pertencem à família. (...)

(...) a escola está hoje confrontada - diria mesmo sufocada - com uma complicada alquimia por intermédio da qual procura responder a tantas novas responsabilidades educativas. (...)

(...) Estamos perante dois conceitos - educação e ensino - que se confundem hoje de forma dramática. (...)

(...) este verdadeiro emaranhado de equívocos, deslizamentos lógicos e falhas conceptuais em que está enredada a instituição escolar(...)
(O que importa, no pensar de Olga Pombo? Deixo em "suspense" a controvérsia que provavelmente suscitará.)

sexta-feira, novembro 25, 2005

Memória de uma aventura...

... memória em "clima" de fim de semana...
... com dedicatória ao Miguel Pinto e ao Miguel Sousa.


(Fotos privadas, 2001)

E depois... a subida... a subida... e o passeio com a maravilhosa paisagem por baixo. E depois... a descida, até eu ter que pensar se ia conseguir aterrar a correr, isto é, sem me estatelar. Mas a aventura toda não posso mostrar, que o fotógrafo não tinha asas para acompanhar.
P.S.: Suponho que cá também seja como lá, em que só um encartado tem permissão para levar um não encartado, por isso até uma bisavó centenária (que contam que ainda há algumas em forma) pode experimentar a aventura com segurança... aqui fica o desafio às vovós ;-)

quinta-feira, novembro 24, 2005

Adenda: Outros sonos

Francisco Goya, El sueno de la razon produce monstruos

Fim de semana...

Estou em fim de semana porque tenho a 6ª feira livre (ai o que vão dizer!!!). Mas para manter um dia livre - tiraram-me as reduções quando até já me posso reformar, só que não me apetece (não me apetecia até há 4 meses atrás) e os meus alunos mostram que isso não lhes passa pela cabeça, ao menos, dia livre!! -, para manter dia livre, dizia, os outros ficaram tão carregadinhos com a componente lectiva + a componente não lectiva não individual (que a individual decorre na semana e no fim de semana), que chego ao final de quinta a apetecer-me dormir 12 horas seguidas. Hoje, e não pela 1ª vez, como saio da escola às 18.30 e é o dia em que vou buscar os netos para dar de jantar porque é dia em que os pais têm um horário complicado, só fui capaz de os levar a jantar ao restaurantezito da esquina. Não deixamos de nos divertir, mas chego a casa a sonhar com dormir 12 horas (não confesso que o sonho é para 24 horas por vergonha). Sempre fui um tanto animal nocturno na produção ou trabalho individual - componente não lectiva individual na escola, para mim, portanto, só quando as escolas tiverem camas - mas hoje... VOU DORMIR!

Pela blogosfera sem sabermos uns dos outros

Hoje, por um ocasional mas simpático contacto, descobri aqui mais um blog de professor. E logo meu colega nesta lide em que um dos primeiros empreendimentos é tentar combater as imagens sobre a disciplina de Matemática que tantos alunos já trazem inculcada na mente quando entram na escola.

terça-feira, novembro 22, 2005

E quando falam deles?...

... Deles directamente, deles mesmos?
... E para eles?
... E com eles?


Stephen Scott Young, Her Cat

(Autor deconhecido)

Falcon Nyght (2005), Waiting - Photo

O debate e as minhas imagens

(Estou a ficar preocupada com a minha mente!)


Borisenko Pavel (1998), Mirage

Pisarev Gennadiy (2004), Stone

segunda-feira, novembro 21, 2005

Outra vez... é demais.

Adenda:
E a Srª Ministra da Educação tem a certeza de que, com as suas teimosas precipitações, não está a contribuir para que mais alunos distingam com a tão pouca precisão abaixo exemplificada noções como aula e recreio, ou trabalho e lazer, ou concentração e distracção?
______________________________
Escrevi no post anterior que agora é "tempo de dizer também, honestamente, que ninguém está totalmente isento de pecado."
Aparte casos de agentes de ensino que talvez devessem estar a fazer outra coisa - que existirão, ou então esta profissão seria uma excepção a todas as outras -, não se pode deixar de reconhecer que existem práticas a corrigir. No aspecto específico em que tocará este post, não se esquece as dificuldades e o stress que certas turmas causam, sobretudo no início do 2º Ciclo (também certamente no 1º Ciclo), pela existência nelas de alunos que são o reflexo do seu meio sócio-familiar extremamente desfavorecido e problemático. Não se esquece que, antes de se ter condições para ensinar as matérias escolares, há por vezes um tempo longo em que os objectivos são o saber estar numa aula em posturas minimamente razoáveis, o motivar para a escola e o integrar em tarefas escolares. Mas os dois casos que aqui vou focar já não são esses.

Mais uma vez os professores de uma turma, por um acaso em que todos ou quase todos a recebe pela 1ª vez no 8º ano, se depara com ela sem ter sido educada a saber estar numa aula, revelando hábitos de aí estar em grande barulho e agitação mesmo quando a professora explica, e mesmo com comportamentos de quem está num recreio - e sem vigilante. Não se trata em geral de alunos chamados "problemáticos", não se trata em geral de alunos com procedimentos que requerem sanções disciplinares por, por exemplo, frontais faltas de respeito aos professores. Trata-se de alunos que puderam passar o 7º ano na atitude e no ambiente referidos. Não que eu pense que não foram admoestados. Penso, sim, que existe um problema de confusão, de não consenso e sobretudo, talvez, de grande insegurança quanto à questão da permissividade. E esta é uma questão que precisa de ser debatida nas escolas. Não para acusar, mas para reflectir e construir. Não para estigmatizar, como faz ou permite fazer a actual ministra da Educação, mas para concertar actuações e consciencializar todos de consequências irremediáveis que estas situações podem ter quando só se colmatam num ano tão tardio como o 8º.

Foi assim que me chegou a turma que, no ano lectivo anterior, recebi no 8º - turma de que já aqui falei em Setembro, chamando-lhe a minha prioridade e contando que a minha pergunta "como vou fazer?" se seguia à pergunta que me fazia no 3º Período do ano anterior: "posso fazer alguma coisa?" (Também depois voltei a mencioná-la para contar que já me estava a dar alegrias).
Foi novamente assim que me chegou a minha turma de 8º deste ano. Mais uma vez, foram necessárias algumas semanas (a mim e decerto aos meus colegas) para conseguir (sem recurso a sanções disciplinares) o ambiente minimamente indispensável a um normal funcionamento. E, após essa etapa, nada mais fiz até ao fim da 1ª semana deste mês de Novembro senão tentar colmatar algumas grandes lacunas do 7º ano - lacunas inevitáveis quando os respectivos alunos são os primeiros a reconhecer que não prestavam atenção no ano anterior; lacunas em matéria essencial, mas apenas, por agora, relativa a pré-requisitos indispensáveis para a aprendizagem do que vamos tratar no início do 8º. No entanto, nem esta acção de recuperação tem resultado para bastantes alunos dado que, embora agora já razoavelmente disciplinados, hábitos de concentração e de trabalho na própria aula, motivação e sentido de responsabilidade não se adquirem de um momento para o outro.
No entanto, o mais problemático nestas situações, o que referi poder ter consequências irremediáveis, é que para alunos, em considerável número, que, por essa desatenção permitida ou não ultrapassada atempadamente, foram transitando com nível negativo em disciplinas sequenciais como Matemática e Inglês, ao modificarem a sua atitude (até porque a idade facilita que comecem a preocupar-se), as grandes e por vezes longínquas lacunas já lhes torna verdadeiramente difícil a recuperação, porque o professor não vai contar com grande esforço em casa e o trabalho diferenciado e individualizado na sala de aula para conseguir a recuperação minimamente indispensável faz muito, mas não faz milagres.

domingo, novembro 20, 2005

Mas hoje é domingo.

Félix Vallotton (1895), Le Beau Dimanche

E hoje é domingo. E depois...

... Depois será o tempo de dizer também, honestamente, que ninguém está totalmente isento de pecado.

Permito-me transcrever palavras do
Miguel Pinto, pois penso que o seu "há muito tempo" remonta a tempo anterior àquele em que a actual Ministra da Educação nos deixou sem espaço-tempo para reunir e discutir o que de facto urge discutir sobre Educação / Ensino-Aprendizagem.

"
Há muito tempo que venho denunciando o défice de discussão no interior das escolas.

Já é domingo, mas o Miguel deu-me a deixa, não resisti a deixar dito já algo em comentário que escrevi lá no seu post.

Mas, hoje é mesmo domingo, fico-me por esse comentário lá, e com esta referência ao seu texto (o qual, atenção, não se confina ao que transcrevi, que deve ser lido no respectivo contexto).

sexta-feira, novembro 18, 2005

Exigimos Respeito

Foto privada

A anedota do dia (verídica)

Walter Lemos, em 1993: É presidente da Assembleia Municipal de Penamacor; perde mandato por... excesso de faltas!

Contrastes

Porque

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

Sophia de Mello Breyner Andresen

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A fuga

Mário Eloy Pereira

quarta-feira, novembro 16, 2005

...

Farsa

Michael de Ghelderode

"Pedagogia diferenciada na sala de aula"

Comecei a ler o Despacho Normativo nº 50/2005 e não li mais, irritada, depois de:

"3—O plano de recuperação pode integrar, entre outras, as seguintes modalidades:
a) Pedagogia diferenciada na sala de aula."

Como disse já o Miguel Pinto, "num ápice, a pedagogia não diferenciada foi legitimada". Sim, porque apenas "pode integrar" (como uma mera sugestão).
Não sei o que sente cada professor, mas eu, desta vez, nem me senti ofendida, apenas gozada. Mas é toda a minha vida profissional que é gozada, como acho que se notará nesta memória tão longínqua que me lembrei há tempos de guardar neste cantinho.
E mais não digo, porque tenho uma coisa mais importante para fazer: libertar-me da irritação, que esta ministra, a mim, não merece que me lembre sequer que existe. (Se ela desse aulas, saberia sequer o que é diferenciar?)

Última hora...

... fuga.

Ainda ontem tinham
18 (dezoito) razões ...

Mas quem se surpreende ao fim de 23 anos? (Sim, desde Novembro de 1982, tivemos muito tempo para aprender que contar com tanta unidade é pura ingenuidade).

terça-feira, novembro 15, 2005

Até 6ª feira, aguardo.

Poderá ser compreensível que, face a uma qualquer greve por determinada reivindicação ou por uma alteração de normas legislativas em vigor, se argumente que, face à evidência da não cedência do "Patrão" em causa, essa greve é inútil, e que o dinheiro não é para perder inutilmente. Mas uma greve também pode servir para demonstrar a verdade do que afirmam os seus proponentes - a verdade de que traduzem sentimentos gerais. Tal como uma assembleia numa sala em que os presentes levantam (ou não) o braço a manifestar acordo, a próxima greve não deixará de ser a assembleia geral pública em que só os que levantarão o braço confirmarão o que os promotores dessa greve afirmam representar o pensar e o sentir da classe docente:

Que há "horários dos docentes que descaracterizam profundamente os aspectos essenciais da sua profissionalidade", e que "grassa a desmoralização nas salas de professores", os quais se sentem "humilhados e ofendidos na sua dignidade profissional"

Que a imagem dos educadores e professores tem vindo a ser sujeita a um inqualificável ataque, "provindo até de quadrantes inesperados", "com o intuito de denegrir a imagem do conjunto dos docentes perante a sociedade", num péssimo serviço à Educação pois "não é possível atingir-se a mais alta qualidade nos processos de ensino-aprendizagem sem professores profissionalmente motivados e socialmente prestigiados"

Que "os professores estão entre os primeiros interessados numa escola de qualidade, em que sejam tomadas medidas sérias de promoção do sucesso educativo para todos", mas não em que sejam tomadas medidas precipitadas que redundam em mera guarda de alunos, sem condições nem tempo para planear, viabilizar e estruturar projectos de modo a, efectivamente, "da permanência acrescida resultarem condições mais favoráveis às aprendizagens dos alunos e ao combate ao abandono escolar" e para se caminhar sob perspectivas de real transformação da escola.

segunda-feira, novembro 14, 2005

Repetindo: carroça à frente dos bois.

Permito-me transcrever os dois extractos abaixo, do artigo de João Rangel de Lima publicado no Inquietações Pedagógicas. Permito-me porque o primeiro traduz o que sempre considerei o maior erro da actual ministra da educação e escrevi, por outras palavras (menos suaves), em 27 de Setembro: (...)Poderá a Srª Ministra da Educação ter tido boas intenções, possíveis de virem a dar frutos. Mas, a sua precipitada e obsessiva preocupação prioritária de estarem os alunos sempre ocupados na falta de professores, sobrepondo essa obsessão à viabilização, nas escolas, de ocupações pedagógicas (que, se acaso sabe o que isso é, pelo menos não faz a mínima ideia de que não se improvisam, mas sim se preparam mediante projectos e recursos) destruiu o que, eventualmente, poderia corresponder a intenções válidas.(...)

"A Srª Ministra não fala com os agentes educativos antes de decidir e tem um péssimo sentido de timing. Se assim não fosse, teria tido a calma de, durante este ano lectivo, apresentar o seu projecto de componente não lectiva e teria tido a dita de ouvir sugestões úteis e as Escolas teriam tido tempo de estruturar os tempos referidos em respostas úteis e realmente transformadoras da Escola. No próximo ano lectivo concretizar-se-ia o projecto."
(...)
"Não podemos continuar a oscilar entre estes dois desgraçados polos que têm marcado a nossa História: diálogo permanente sem decisão ou decisionite autista e arrogante. A primeira cria a deriva e o caos, a segunda uma ordem inoperante e crispação social - no próximo dia 18 há greve de professores."

?????

Unity Jump

Rogers Charles
_______________________________

"Na opinião da ministra há questões que têm de ser clarificadas, mas nada que se aproxime da exigência de suspensão, na medida em que, referiu, os órgãos de gestão sentem-se "confortados" com estes dois despachos." (Despachos 16795/2005 e 17387/2005) (Reunião FENPROF / M.E. de 11 de Novembro de 2005)

"Confortados"???!!! Não será que a Srª Ministra está mais uma vez a generalizar, contente, a partir de alguns eventuais casos confortáveis? (Que o meu CE não está nadinha confortado, isso sei; mas sobre tudo o mais desta presente história, já não sei nem o que sei nem o que não sei)

quinta-feira, novembro 10, 2005

Aguardemos o uso da lógica

Resumindo - O M.E. :
a) Considera positiva a aplicação da legislação.
b) Reconhece a insatisfação da classe docente.
Aguardemos como as mentes pensantes do M.E. aplicarão a lógica, o raciocínio rigoroso, a reflexão intelectualmente honesta - ou simplesmente, como aplicarão o princípio da não contradição - para uma ligação coerente entre essas duas assunções.

quarta-feira, novembro 09, 2005

Roots of Empathy

O Miguel Sousa chamou a atenção num seu post para um programa de sucesso no Canadá e pôs o link para o respectivo site informativo. Não resisti a esta foto...

terça-feira, novembro 08, 2005

Que coisa...

...não tapei a boca ao espirrar! Tinha ficado muito melhor assim.

Joan Miró, Silence

...

Joan Miró, Dog bark at moon

(Dizem que o cão ladra por medo e eu digo que o anónimo se esconde por cobardia)


Anonymous said...

Este deve ser o mesmo anónimo que já vi, no mesmo blog, insultar gratuitamente os seus autores. Mas como, nos comentários, estes anónimos passam despercebidos, transcrevo a resposta que agora me foi dada a mim, nesse blog. Não porque mereçam qualquer atenção, mas porque faz parte do conhecimento da realidade conhecer o género de exemplos que também existem na mesma. E, já agora, para dizer que de facto na net não posso fazer o que faria no real, frente a frente (mesmo que se tratasse de algum grandalhão - não sou de grande estatura física, sou mulher e até já bem avó, mas faria) a quem se atrevesse a desrespeitar-me: um bofetão bem chapado na cara.

"(Mas fico por aqui, confesso que não estou habituada a falar com anónimos) -------------------------------Concordo.Diria mesmo que nos tempos que correm é mais seguro. E depois é reconfortante falar sempre com os mesmos sobre o mesmo.Por isso é que se inventou a net.Assim só falamos com gente conhecida.Pobre juventude do meu país que tais mestres tem que aturar.Fique com os seus e não se deixe contagiar, a vidinha não está para grandes aventuras... "
(O destaque é meu)

domingo, novembro 06, 2005

sexta-feira, novembro 04, 2005

...




"Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito.
"

Oswaldo Montenegro, in Metade


Que sentido isto faz?

Está a fazer meio ano, este blog. Criei-o em Maio, a carreira docente perto do fim (não tão perto assim como projecto e opção, mas agora tornada perto por, de repente, nuns escassos dois ou três meses, ser empurrada para me dizer Estou farta!).
Pensei num espaço onde iria colocando e guardando memórias profissionais. Como professora de Matemática, notas sobre aquilo em que sempre pensei - a disciplina de maior taxa de insucesso, os métodos que a podem minorar, esse ganhar gosto pelas aulas de Matemática quando os putos descobrem que, afinal, são capazes, aquelas aulas em que ao fim de dois meses pequenotes de 10 anos punham os seus grupos a funcionar activamente e pareciam mini-professores esquecidos até de onde andava a professora na sala ocupada com outro grupo qualquer, mais outro pequenote, também "dispensando" a professora para dizer em voz alta "discutam mais baixo, assim não conseguimos concentrar-nos!".
Mas não apenas como professora de Matemática, que antes disso sou professora - educadora simplesmente. Também memórias soltas de coisas maravilhosas que eles e eu descobríamos que eles eram capazes de fazer, por exemplo, mas não só, naquele espaço que dava a direcção de turma - coisas, entre outras, como aqueles convites das turmas aos pais para uma reunião sobre tema que bem queriam discutir com estes, mas a que só se atreviam sob a segurança de uma preparação que eles próprios faziam, mas que faziam com essa segurança de a fazerem com a dt - coisas que sempre me continuavam a maravilhar e que tão encantados deixavam os pais, coisas, enfim, essas e outras, que são o motivo do lema deste blog.

Criei o blog mal conhecendo a blogosfera e desconhecendo completamente aquela a que costumo chamar blogosfera docente. Não me preocupava ter ou não visitas, era um espaço para ir escrevendo quando tivesse tempo, talvez para mais tarde, quando reformada, fazer dos soltos algum todo organizado.
Seriam memórias sobretudo do longo tempo a leccionar 2º Ciclo - que é de pequenos que eles têm que começar, se não começam aí já é difícil o 3º Ciclo ser igual. 2º Ciclo em que permaneci a leccionar a maior parte da vida por força dos estágios não congelados na altura em que principiei, que os outros estavam congelados, e a oportunidade de segurança e estabilidade profissional tinha que se sobrepor ao gosto de passar a vida a trabalhar com adolescentes.

Mas as memórias mudaram. Mudaram um pouco quando a minha escola de há já bastantes anos (e definitiva, que não se deita fora a sorte de chegar a dois passos de casa) passou a escola 2,3, e a profissionalização para o 3º Ciclo (e Secundário, que não existem "professores de 3º Ciclo") me permitiu ter ainda o gosto de trabalhar com adolescentes - mudaram um pouco sobretudo ao deixar quase de leccionar 7º para receber as turmas já no 8º. Não foi, no entanto, essa a razão importante da mudança.
A minha primeira "pré-reforma" foi da direcção de turma, muitos anos já cumprida e em que só aceitava outro cargo sob pedido/condição de ela não me ser tirada. Porque veio a invasão da burocracia, e eu não suporto papeladas/burocracias inúteis, e os tempos em que antes se discutia foram substituídos pelos tempos de escrever papeis a dizer o que se deve (devia) discutir sem sobrar mais tempo senão para arquivar o que ninguém volta a ler a não ser quando há que acrescentar umas frases (leia-se substituir umas palavras por outras mais na moda a quererem dizer o mesmo). Depois vieram outras pequenas "pré-reformas" à medida que fui sentindo quase só gratificante e não deitado para a gaveta o Eu com os meus alunos, a minha sala de aula. (Sempre foi minha opção de vida não persistir em coisas inúteis, excepto nas inutilidades nos meus tempos livres, deixadas de serem inutilidades se me descontraem ou me dão prazer).

Que sentido podem ter memórias dessas coisas a que chamei maravilhosas para quem, no tempo para um cargo pedagógico, é obrigado a passá-lo todo a preencher papeladas e registos, a enviar cartas com aviso de recepção para ficar a prova de que foram convocados os pais que nunca apareceram, etc., etc., etc.?

Que sentido podem ter memórias daquela velha defesa quase militante (muitos já hoje reformados) de diferentes métodos e estratégias para o ensino-aprendizagem da Matemática, para desenvolver nos putos uma relação desafiante e autónoma com essa disciplina, para quem (incluindo-me a mim) se vê não só num sistema degradado por um percurso de disparates e prioridades hipócritas de sucessivos ministérios da educação, não só, para mais, numa sociedade que cada vez menos educa as suas crianças para o hábito de trabalhar, pensar, fazer esforço, mas também se vê por fim responsabilizado por um sistema em que, se algumas responsabilidades tem, é o menos responsável de todos (e até impede esse sistema de ainda mais degradado estar) - em suma, se vê por fim desrespeitado e desprestigiado para que outros se protejam disso?

Que sentido?
______________________________

(...)
Que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
pois metade de mim é o que eu grito
a outra metade é silêncio.
(...)
Que a minha vontade de ir embora
se transforme na calma e paz que mereço
que a tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
a outra metade um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
e o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
que o espelho reflicta meu rosto num doce sorriso
que me lembro ter dado na infância
pois metade de mim é a lembrança do que fui
a outra metade não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito
e que o seu silêncio me fale cada vez mais
pois metade de mim é abrigo
a outra metade é cansaço.
(...)
Que a minha loucura seja perdoada
pois metade de mim é amor
e a outra metade também.

Oswaldo Montenegro, Metade

quarta-feira, novembro 02, 2005

Pequenos tijolos que também fazem alicerces

Estou a ler o livro de memórias de infância de Alice Vieira (Bica Escaldada, 2004, Ed. Casa das Letras). Apeteceu-me registar o que, em dois dos contos-memórias (cada um com pouco mais do que uma página), me causou uma associação de ideias... nas diferenças com o Hoje - associações que me acontecem ao ler um conto não lendo nele apenas e à letra o que conta, mas lendo-o como que uma metáfora.

Em O Anjo, a autora conta que a avó Ana, que nunca fora à ecola, um dia, passava ela já dos 70 anos, anunciou, no silêncio de uma refeição: "_ Apareceu-me um anjo esta noite. (...) _ O anjo mandou-me aprender a ler." E prossegue Alice Vieira, um pouco adiante: "Nunca mais voltou a falar do assunto, que as mulheres nunca repetiam uma ordem ou um desejo: o que se dizia uma vez, dito ficava. Ela própria se encarregou de arranjar uma professora. (...) Se o anjo voltou a ter interferência na aprendizagem da avó Ana, não se sabe nem ela o disse. Sabe-se apenas que a avó Ana aprendeu a ler e a escrever no espaço de um mês. _ Foi o anjo - era a sua única explicação" E a autora termina logo a seguir o conto, assim: "Dizem que, desde essa altura, um anjo passou a velar pelos destinos das mulheres da nossa família. Entre a comunidade celestial devemos gozar da fama de sermos exemplarmente obedientes."

Em Cheiros Perdidos, Alice Vieira lembra o tempo "em que as coisas cheiravam àquilo que eram", os cheiros genuínos das maçãs, dos morangos, do pão, dos soalhos das casas... . Refere como as nossas casas hoje cheiram aos ""purificadores do ar"" que prometem vários aromas e "se ficam todos pelo mesmo odor plastificado a coisa nenhuma que, como toda a gente muito bem sabe, é o pior cheiro que existe à face da terra" (Sublinhado meu). E, quase no final do conto: "Acreditem que eu até tenho saudades do terrível sabor do óleo de fígado de bacalhau (antes de ele ter sido adocicado para os paladares das sensíveis crianças dos nossos dias), do azedo genuíno dos primeiros iogurtes (...) e da intragável canja de galimha, à qual, antes de partirmos para a praia, a tia Clara juntava o então indispensável óleo de rícino. Aquilo sim, aquilo eram sabores a sério, puros e duros. Aquilo (...) formava o carácter de uma pessoa."